Gustavo Maia Gomes
Josefina Cristina Amélia Quanz (c.1871-1922) e
Francisco Dias Cardoso Filho (c.1865-1917) no dia
de seu casamento, em Santa Rita, PB,
provavelmente, em 1893.
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Francisco Dias Cardoso Filho (1865-1917) nasceu em Guaratiba, subúrbio do no Rio de Janeiro , formou-se engenheiro civil pela Politécnica do Rio (1888), morou em Santa Rita (PB) e faleceu no Recife |
Um
dos perigos enfrentados por quem garimpa velhos jornais, tentando recuperar
histórias de pessoas há muito tempo falecidas, é ser confundido por homônimos.
Conto um caso real, em que as coincidências de nomes, locais e época se
multiplicaram notavelmente, quase me fazendo acreditar em aparências
plausíveis, mas falsas.
Quando
comecei a resgatar as notícias antigas sobre um dos meus bisavôs, dele eu
sabia, quase unicamente, que:
(1) seu nome era Francisco Dias Cardoso;
(2) havia
nascido em meados do século XIX, provavelmente, em Guaratiba, Rio
de Janeiro;
(3) estudara no Colégio Pedro II, do Rio;
(4) era de família muito
pobre;
(5) formara-se em engenharia; e
(6) já adulto, viera morar em Santa
Rita, Paraíba.
De posse dessas informações iniciais, acionei os mecanismos de
busca da Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional. Surpreendeu-me encontrar
muitas aparições do nome Francisco Dias Cardoso, a mais antiga datando de 1825.
Pela cronologia, não seria meu bisavô, mas poderia ser o pai dele. Mas esse
homem tinha uma frota de barcos que operava, sobretudo, no porto de
Mangaratiba (RJ). Foi, portanto, um homem rico! Na rápida exposição que ora faço,
esse primeiro Francisco Dias Cardoso será identificado como M1 (M de Mangaratiba;
1 de pai). Logo ficará claro o porquê desta codificação.
Anos
à frente, nos 1870, aparecem informações sobre outro, ou outros (descobri,
depois, que eram dois) Francisco Dias Cardoso, a cujos nomes, em alguns casos,
se acrescentava o sufixo “Filho”, ou “Junior”. Vou chamar o primeiro desses dois
homens M2 (Mangaratiba Dois, ou seja, o filho do M1). O segundo será G2.
Guaratiba Dois, sim, porque também descobri existir um G1 (Guaratiba Um). Este
foi meu trisavô, mas só tive certeza disso bem depois.
Portanto, o Francisco
Dias Cardoso que eu, inicialmente, procurava, era o que, agora, identifico como
G2. Vejam, então, o tamanho do problema: ao invés de um, havia quatro Francisco Dias Cardoso, todos
vivendo na mesma época e no mesmo Rio de Janeiro (Província, depois Estado; e
cidade) e em lugares com nomes muito parecidos: “Mangaratiba” (município do
hoje Estado do Rio de Janeiro) e “Guaratiba”, subúrbio afastado da cidade do
Rio de Janeiro, mais distante do que o Recreio dos Bandeirantes. Como separar
os Francisco que, para minha investigação presente, eram “falsos”, dos que eram “verdadeiros”?
Especialmente, como eu poderia distinguir os Dias Cardoso que não eram meus
ancestrais daqueles que eram?
A
resposta veio por etapas. M1 era rico, mas isso poderia significar que minha
noção inicial (alimentada pela tradição familiar) de que os pais de G2 eram pobres estava
errada. (Quem sabe não se tratava de uma versão difundida, à
época, para garantir que o menino estudasse de graça no Colégio Pedro II? Ele,
de fato, teve este privilégio.) Além do mais, eu sabia que G2
era de “Guaratiba”, mas esta palavra é tão parecida com “Mangaratiba” que bem
poderiam os dois nomes se terem confundido nas lembranças antigas e não
escritas dos meus parentes.
Dois
fatores pesaram decisivamente para que eu conseguisse identificar quem era
quem, dentre os quatro Francisco Dias Cardoso:
(i) um dos dois Francisco mais
novos (juventude que pude deduzir pela natureza de suas atividades respectivas,
em anos próximos) foi apresentado, uma vez, como “bacharel”. Este era um termo,
normalmente, reservado aos formados em Direito. Não podia ser G2 (que viria a
ser engenheiro); mas, podia ser M2.
(ii) O segundo fator é que,
enquanto um dos dois Francisco mais novos (ambos habitando, então, a cidade do
Rio de Janeiro) estudava engenharia na Escola Politécnica, tendo as notas publicadas nos jornais (devia ser G2, portanto), o
outro, o bacharel, somente aparecia no noticiário quando se relacionavam as pessoas presentes às sessões periódicas de beija-mão do Imperador. Este segundo Francisco, por
exclusão, devia ser M2. Ou seja, enquanto o Francisco (G2) filho do
Francisco pobre (G1) estudava engenharia e tirava notas altas; o Francisco (M2)
filho do Francisco rico (M1) aparecia nos jornais como um dos mais assíduos
puxassacos da Corte.
Finalmente,
em umas poucas ocasiões, o pai do “verdadeiro” Francisco Dias Cardoso (ou seja,
G1) teve seu nome estampado nos jornais. Por exemplo, em convites para missas
fúnebres ou quando ele fez publicar um anúncio dirigido ao
Ministro do Império, agradecendo por este se dispor a custear os estudos de seu filho G2
no Colégio Pedro II. Foi só depois de ler essas notícias (e as que se referiam
ao Francisco pai rico, M1) que me veio a convicção completa de que quatro
Francisco Dias Cardoso viveram no mesmo Rio de Janeiro, cidade e
Província-Estado, quase no mesmo tempo.
Só não consegui ter certeza de que M2,
o Francisco Cardoso Filho que beijava a mão do imperador com regularidade
exasperante, era, mesmo, filho de M1, o Francisco Dias Cardoso dono de barcos em Mangaratiba – este, uma figura muito querida e popular na sua cidade. Mas como
o ponto era irrelevante para meus objetivos de pesquisa, deixei-o de lado.
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