Gustavo Maia Gomes
Doroteia Kruss (1840-c.1902) A criança no colo é, provavelmente, Olga Dias Cardoso (1896-1978). (Foto do acervo de Heloisa Pedrosa, enviada por seu genro Bento Luiz Silva) |
Christian Frederick William Kruss (1833-95), em foto colhida no site My Heritage / The Kruss Family Website. |
Meu
tetravô (nem sei se a palavra existe), Marcus Kruss, nasceu em Burg auf Fehmarn,
no dia 20/12/1798. Morreu ali mesmo, em 31/5/1886. Trabalhava como Lichtgieber
und Polizeidiener. O que era isso? Polizeidiener, OK, é policial,
mas a melhor tradução que consegui para Lichtgieber foi “cortina de luz”, que não
parece ser uma profissão. A pequena ilha de Fehmarn, no Mar Báltico, era, à época, território
alemão. (Ou dinamarquês, segundo algumas fontes.) [1]
Marcus
Kruss casou-se duas vezes. A primeira (em 1820), com Christina Margaretha Wendt
(1795-1823). Mas, Christina morreu apenas três anos depois. Pelo tempo que foi casada,
devem ter sido dela apenas duas das dez filhas e filhos do policial cortina de
luz: (i) Amalie Maria Christina Kruss (Leiden por casamento) e (ii) Gertrude Kruss (Kukuk,
por casamento). Não sei os anos e locais de nascimento e morte delas.
CASAMENTO
A
segunda mulher (1829) de Marcus Kruss, minha tetravó, foi Catherina Dorothea Prussing
(24/10/1797-22/3/1873), nascida em Orth, na mesma ilha de Fehmarn, localidade distante apenas 14,5km
de Burg auf Fehmarn. Catherina morreu na mesma ilha onde,
aparentemente, vivera toda a vida. O marido, ainda menos inclinado a
mudanças, parece nunca ter saído da minúscula cidade em que nascera (12.000
habitantes, em 2013.)
Com
Catherina Dorothea Prussing, Marcus Kruss teria mais oito filhos (todos com
sobrenome Kruss): (iii) Magdalena Wilhelmina (Krohn, por casamento); (iv) Jacob;
(v) Christian Frederick William (6/1/1833-27/11/1895); (vi) Carl Heinrich; (vii)
Daniel Gottlieb; (viii) August Carl Ludwig; (ix) Anna Dorothea, de quem não há
registro de que se tenha casado; (x) Dorothea Elise Kruss (Quanz), nascida em
1840, décima filha de Marcus, oitava de Catherina Dorothea. Minha trisavó.
Enquanto
Marcus e Catherina viveram e morreram no mesmo lugar, uma ilha pacata, que destinos geograficamente tão diferentes teriam seus
filhos Christian Frederick William Kruss e Dorothea Elise Kruss (Quanz por
casamento)! Ambos nascidos em Burg auf Fehmarn, Alemanha ou Dinamarca, um foi
parar em Welshmans Reef, Vitória, Austrália; a outra, em Santa Rita, Paraíba,
Brasil. Isso, aí pelos anos 1860-70, mais ou menos.
PARAÍBA
Dorothea
Elise Kruss Quanz – ou Doroteia Elizabeth, como seu nome aparece aportuguesado nas
Memórias da trineta Heloisa Pedrosa – nasceu no dia 25 de junho de 1840, no
mesmo Burg auf Fehmarn onde Marcus Kruss viveria toda a vida. Talvez não fosse
o melhor lugar do mundo para uma moça arranjar casamento. Tornando as coisas
mais difíceis, já com 25 anos de idade e ainda solteira, a jovem não era
bonita. (A julgar pelos retratos que se conservaram, não, mesmo.) Mas, tinha
padrinhos. Um deles, Henry Leiden, industrial do ramo cervejeiro, era casado com a
meio-irmã de Dorothea Elise, Amalie Maria Christina Kruss, filha mais velha do
primeiro casamento de seu pai.
O
cervejeiro prussiano Henry Joseph Leiden fundara e era dono de fábricas no Rio de Janeiro (desde 1842; ele é considerado o pioneiro desta indústria no Brasil) e no Recife (pelo menos, desde 1866).
E era tio de Henri Quanz, alemão da Baviera, que perdera os pais ainda criança
e fora morar com parentes em Paris. O que Henri Quanz fazia na França, não sei. Mas ali
se casou com uma francesa, teve duas filhas (Ana e Valentina) e, de súbito, a mulher morreu.
Estamos, nesta altura da narrativa, em um ano próximo a 1866. Leiden tinha interesses industriais no Brasil,
mas morava na Europa. Precisava, especialmente, de alguém confiável para administrar a fábrica do
Recife. Convenceu o sobrinho recém-viúvo Henri Quanz a vir residir em Pernambuco. E lhe arranjou a
noiva que queria “colocar”: sua cunhada (dele, Henry Leiden) Dorothea Elise Kruss.
Em
1868, Quanz brigou com Leiden e o casal Henri-Dorothea se mudou para a Paraíba,
onde os dois viveram o resto das vidas. Sua filha Josefina Kruss Quanz casou-se
com Francisco Dias Cardoso Filho, engenheiro vindo do Rio de Janeiro para a
Paraíba e com ele teve cinco filhos: Raul, Olga, Henriqueta, Corina e Maria
Helena. Conheci e convivi com todos eles. Não
tenho notícia de que minha trisavó Doroteia Elizabeth, na versão aportuguesada
de seu nome, tenha, jamais voltado a Burg auf Fehmarn, ou à Alemanha, ou à
Dinamarca, ou à Europa.
AUSTRÁLIA
A
narrativa feita até aqui é, em suas linhas gerais, conhecida dos descendentes de Dorothea Elise (ou Elizabeth) Kruss. Mas há outra ponta da história inteiramente
desconhecida, que descobri recentemente. É que o irmão de Dorothea, Christian
Frederick William, sete anos mais velho do que ela, também fez uma viagem
transoceânica da qual jamais retornaria.
Foi morar na Austrália, num lugar
chamado Welshmans Reef, a 114 km de Melbourne, no Estado de Vitória. Não tenho a menor ideia (ainda) do que ele terá ido fazer lá. Será que Henry Leiden também tinha interesses comerciais na Austrália? Não sei. O fato é que Christian foi morar naquele lugar incrivelmente distante.
Deu-se, então, o duplo paradoxo: enquanto
seus pais, Marcus Kruss e Catherina Dorothea Prussing, nunca saíram do pequeno
lugar onde haviam nascido, entre a Alemanha e
a Dinamarca, dois de seus filhos foram bater com os costados em fins-do-mundo
extremamente distantes não apenas de Fehmarn, mas, sobretudo, um do outro: Dorothea, no Brasil; Christian, na Austrália.
[1]
Boa parte das informações deste artigo foi colhida em "My Heritage / Kruss
Family Website". (Alguns dos dados são divulgados apenas para os assinantes do
site, o que foi meu caso, por um breve tempo.) As Memórias de Heloisa Pedrosa, editadas por Martha Pedrosa Resende, também foram utilizadas. Umas poucas informações são resultado de pesquisas anteriores feitas, sobretudo, na coleção de jornais da Hemeroteca Brasileira Digital da Biblioteca Nacional.
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