Gustavo Maia Gomes
(Adaptado de “A mulher que estrangulou o marido”. Jornal do Brasil, 4/7/1929)
O tenente Franco, sua mulher Dalila e o resultado da última briga do casal (Jornal do Brasil, 4/7/1929) |
Dalila falava com desembaraço, em voz baixa, sem
gesticular, as mãos que apertaram a garganta do tenente Franco escondidas sob a
mesa. Disse ter sido casada durante 18 anos e que fora sempre infeliz. O
marido, ébrio incorrigível, ciumento ao extremo, era responsável por seus pesares.
Franco costumava entrar em casa a desoras, sempre
violento. Constantemente, nascia daí uma discussão acalorada e os cônjuges
acabavam em luta corporal. Certa vez, o tenente ensopou a colcha da cama e com
ela cobriu o rosto da mulher, sufocando-a por uns momentos. Na rua, em público,
o marido a insultava, muitas vezes.
Sobre a noite fatídica, a mulher confessou ter
apertado a garganta do marido em ato de defesa. Disse que deviam ser oito horas
da noite quando Franco, embriagado, chegou da rua. Começou insultando-a à
frente do prédio. Depois, espatifou uma cadeira na porta. Dalila achava-se em
casa com as filhas Diva, Lourdes e o filho Nelson.
Depois de provocar escândalo em frente à casa, o
tenente avançou para a esposa. Travaram os dois uma luta encarniçada. Rolavam
pelo chão. Mordiam-se. Esbofeteavam-se. Gemiam. Diziam imprecações. Houve um
momento em que se ergueram e miraram-se, em desafio. Tornaram então a se
engalfinhar.
Dessa vez, a arena foi o próprio leito conjugal. Diva,
aflita e cheia de ódio pelo pai, procurava auxiliar a progenitora, quando ela
ficava por baixo. Afinal, Dalila, de cima, conseguiu apertar o pescoço do
marido, aplicando nessa operação todas as suas forças. Ele debate-se, agitando
os braços e as pernas. Súbito, seus membros caíram sobre o leito. Então,
Dalila, recompondo-se, insistiu no desafio:
– Vem agora, bandido! – Franco, deitado no leito, de
ventre para cima, tinha as pernas pendentes da cama. Como não se mexia. Dalila
aproximou-se. – Vem, se és homem! – Passaram uns momentos. A mulher começou a
se impressionar com o estado do marido. Sacudiu-lhe, então, a cabeça. O homem estava
morto.
Enquanto Dalila prestava depoimento, seus quatro
filhos, na outra sala, riam, como se nada tivesse acontecido. No término, Diva
indagou da mãe se ela preferia salame ou queijo no sanduíche. Alguém lhe
perguntou se estava arrependida. Ela apenas disse: – Talvez.
Nesse momento, saltaram-lhe as lágrimas dos olhos.
Deixou a cabeça cair sobre o peito. Estava soluçando. Suas mãos, então, surgiram
pela primeira vez. São como todas as outras, mas, naquele momento,
assemelhavam-se a garras de ferro, pavorosos instrumentos do crime.
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