CARLOS
EUGÊNIO (Repórter)
Diário do Nordeste, Fortaleza,
20.07.2013
Reconhecidamente uma das regiões mais
pobres do Brasil, com 18,3% da extensão territorial do País, 28% da população
do Nordeste e com PIB per capita equivalente a um terço do PIB per capta
brasileiro, o semiárido precisa quebrar o paradigma do atual modelo produtivo
pautado na agropecuária tradicional e buscar novos caminhos, investir em outros
setores com maior potencial tecnológico e menos dependente dos recursos
hídricos e da regularidade de água de chuva - que não tem. A observação é do
economista, professor da Universidade Federal de Pernambuco, e consultor,
Gustavo Maia Gomes, para quem "a agropecuária tradicional do semiárido não
tem perspectiva de crescimento. Não tem saída, sem que haja uma revolução
tecnológica no setor. A atividade ainda não está condenada, mas nos atuais padrões
tecnológicos não terá vida futura".
Para ele, os caminhos para uma economia
sustentável para o semiárido passam por investimentos em produtos e setores
como os de energias eólica e solar, a indústria intensiva de produção de
calçados e confecções ou de serviços de educação, por exemplos. "O que não
nos falta é sol, vento. Temos vento com ou sem chuva. Então, por que não
investirmos em energias renováveis? É um caminho, pelo qual podemos estar no
limiar de uma nova cultura tecnológica", sugere.
Regra de sensatez
Palestrante do tema "Desafios à
Região Semiárida", no Seminário Brasileiro e o Desenvolvimento Regional,
promovido pelo Banco do Nordeste (BNB), na última quinta-feira, Gomes defende
que as políticas públicas voltadas à região devem sair da mesmice e investir em
outros caminhos, que assegurem o desenvolvimento de uma economia sustentável e
menos dependente dos programas de transferência de renda - do Bolsa Família,
por exemplo.
"Não há uma receita pronta, mas
precisamos de uma regra de sensatez, que não continue a incentivar no semiárido
atividades muito consumidoras de água, como a agropecuária, que é,
tradicionalmente, uma economia de subsistência. Precisamos investir em pesquisa
tecnológica, se quisermos melhorar a qualidade de vida das pessoas que vivem na
região", alertou o economista.
Indústria
"Por que não pensarmos em polos de
confecções de calçados?", cobrou, perante um auditório repleto de
economistas da região, produtores rurais e técnicos do BNB. "Podemos ter
indústrias na região, mesmo com a seca ao redor", avalia.
Ele citou o exemplo do polo de
confecções do Agreste de Pernambuco, onde, "mesmo em plena seca, em
dezembro último, encontrava-se em plena atividade". Gomes reconhece que,
nesse setor há riscos das empresas se instalarem e, extinto os benefícios fiscais,
irem embora. "Muitas empresas vieram (para o interior da região) no bojo
da guerra fiscal e com a mesma facilidade que chegam, se vão", diz.
O palestrante apontou ainda, a
agricultura irrigada como alternativa ao desenvolvimento social e econômico do
semiárido, desde que se invista no desenvolvimento de novas e variadas
culturas. "Não podemos continuar apenas produzindo uva e manga",
ponderou, citando os casos dos polos fruticultores de Petrolina, em Pernambuco,
e do vizinho, Juazeiro, na Bahia.
"Há quase 20 anos não se implanta
um novo perímetro irrigado no submédio São Francisco", protestou o
economista. O produtor rural de Vale do Açu, Montenegro, tem opinião semelhante
e disse que para continuar exportando e tendo mercado, diversificou a produção
de frutas e hoje produz 16 variedades de melão, e outras de melancia e banana.
"O semiárido do Nordeste é viável, se juntarmos capital, tecnologia e mão
de obra", orienta o fruticultor.
Setores atuam como alternativas para
região
Considerada pelos economistas como
atividades reflexos, o comércio e os serviços são outras opções de atividades
indutoras da economia para o semiárido nordestino. "O comércio varejista
responde aos estímulos de investimentos nas áreas da saúde, educação e até no
turismo", acrescenta, o economista Gustavo Maia Gomes. Ele apontas as
cidades de Sobral, Crato e Juazeiro do Norte, no Ceará, e Caruaru, em
Pernambuco, onde esses setores fluem e geram riquezas, independentemente de
chuvas, de disponibilidade de água.
"O maior desafio é como se
instaurar uma economia viável, em ambiente desfavorável, com escassez de água,
seca e com capital humano com baixa capacitação", destacou, ao questionar
ainda, o atual modelo de transferência de renda, denominado por alguns
economistas como "economia sem produção".
Bolsa Família
"Essa é uma forma errada de se
fazer economia, apesar dos benefícios iniciais do Bolsa Família", frisou,
destacando que, em dez anos, a "economia sem produção" dobrou na
região, em detrimento da produção sustentável. No momento da crítica, à tarde
de quinta-feira, a presidente Dilma Rousseff se encontrava, do outro lado da
cidade, no Centro de Eventos do Ceará, anunciando que o programa Brasil Sem
Miséria vai destinar R$ 48 milhões para mais 20 mil famílias rurais cadastradas
no programa Bolsa Família. Distante do debate sobre a economia do semiárido do
Nordeste, Dilma discursava dizendo que "o Bolsa Família continuará sendo pago
enquanto houver um brasileiro, uma brasileira que precise dele. Esse é o
compromisso do meu governo e foi o compromisso do governo Lula. Somente quem
não conhece o Bolsa Família é capaz de criticá-lo".
Ufanismo
Ao questionar o atual modelo de desenvolvimento
regional,- que em sua segunda fase ainda não disse ao que veio, - Gustavo Gomes
não poupou críticas ao Banco do Nordeste e a lideranças políticas da região.
"Gostaria de destacar a minha crítica ao clima de ufanismo com o que
anunciam o crescimento dos números de financiamentos e empréstimos concedidos
pelo banco", protestou, numa referência ao balanço das operações de
crédito divulgado na abertura do seminário. Pela manhã, o BNB anunciou que os
financiamentos do FNE cresceram 63% este ano.
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