Apareceu, finalmente, o candidato que irá
encerrar os doze anos de governo petista. Não posso, ainda, dizer seu nome. Mas
a entrevista que ele deu, em segredo, a um jornal paulista me foi passada por Edward
Snowden, sob a promessa de que eu só a revelaria depois das eleições de 2014.
Hesitei um pouco, mas resolvi publicá-la
agora. Afinal, que autoridade tem esse senhor para me exigir silêncio? Ainda
mais que ele mora no aeroporto de Moscou, de onde fala em espionagem tanto quanto
a Rádio CBN fala em futebol. Oh, Snowden. Vem morar em um aeroporto brasileiro,
prá ver o que é bom!
Jornal de São Paulo: Quais são, em
sua opinião, os grandes desejos da população brasileira?
Candidato da Oposição: O Brasil quer mudar. Mudar para crescer, incluir,
pacificar. Mudar para conquistar o desenvolvimento econômico que hoje não temos
e a justiça social que tanto almejamos. Há em nosso país uma poderosa vontade
popular de encerrar o atual ciclo econômico e político.
Jornal: Mas os
governos Lula e Dilma sempre elogiaram muito a si mesmos. As verbas de
propaganda nunca foram tão altas e, até três semanas, a presidente nadava em
recordes de popularidade. Era tudo mentira?
Candidato: Se, em algum momento, ao longo dos últimos anos, o
atual modelo conseguiu despertar esperanças de progresso econômico e social,
hoje a decepção com os seus resultados é enorme. Dez anos depois, o povo
brasileiro faz o balanço e verifica que as promessas fundamentais foram
descumpridas e as esperanças frustradas.
Jornal: Por que os
brasileiros estão frustrados? Que promessas foram descumpridas pelos governos do
PT?
Candidato: A economia não cresceu e está muito mais vulnerável,
a soberania do país ficou em grande parte comprometida, a corrupção continua
alta e, principalmente, a crise social e a insegurança tornaram-se
assustadoras.
Jornal: De fato, basta
a China crescer pouco menos e uma crise se instala no Brasil. A soberania também
foi pelos ares, pois a Presidente nada fez diante da espionagem americana.
Sobre a corrupção e a insegurança, não precisamos dizer nada. Há saída?
Candidato: O sentimento predominante em todas as classes e em
todas as regiões é o de que o atual modelo esgotou-se. Por isso, o país não
pode insistir nesse caminho, sob pena de ficar numa estagnação crônica ou até
mesmo de sofrer, mais cedo ou mais tarde, um colapso econômico, social e moral.
Jornal: Não seriam os
problemas atuais uma crise passageira, que o governo poderia superar fazendo novas
desonerações de impostos, criando outro programa populista como Minha Casa Minha
Sobrevida, segurando o preço da gasolina (mesmo à custa de arruinar a Petrobras),
ou dando mais dinheiro aos empresários, via BNDES?
Candidato: A sociedade está convencida de que o Brasil continua
vulnerável e de que a verdadeira estabilidade precisa ser construída por meio
de corajosas e cuidadosas mudanças que os responsáveis pelo atual modelo não
querem absolutamente fazer. A crescente adesão à nossa candidatura assume cada
vez mais o caráter de um movimento em defesa do Brasil.
Jornal: Lula e Dilma se
vangloriavam (agora andam calados, compreende-se) de ter reduzido a
vulnerabilidade externa e criado um amplo mercado interno no Brasil. Ao mesmo
tempo, o ministro da Fazenda responsabiliza o Banco Central americano por tudo
de ruim que nos acontece – admitindo, portanto, que continuamos vulneráveis. O mercado
interno não sustenta a economia. Que caminhos o PT fracassou em percorrer?
Candidato: O caminho das reformas estruturais que de fato
democratizem e modernizem o país, tornando-o mais justo, eficiente e, ao mesmo
tempo, mais competitivo no mercado internacional. O caminho da reforma
tributária, que desonere a produção. Da reforma agrária que assegure a paz no
campo. Da redução de nossas carências energéticas e de nosso déficit
habitacional. Da reforma previdenciária, da reforma trabalhista e de programas
prioritários contra a fome e a insegurança pública.
Jornal: Da sua relação
de fracassos do PT, talvez devêssemos excluir os programas contra a fome. Lula pegou
carona no Bolsa Escola, de FHC, ampliou-o enormemente e colheu dele os frutos políticos
na forma de votos. Mas isso não foi suficiente para deixar a população satisfeita.
A que o senhor atribui as recentes manifestações nas ruas, que levaram a
popularidade da Presidente a despencar?
Candidato: Trata-se de uma crise de confiança na situação
econômica do país, cuja responsabilidade primeira é do atual governo. Por mais
que o governo insista, o nervosismo dos mercados e a especulação dos últimos
dias não nascem das eleições [de 2014]. Nascem, sim, das graves
vulnerabilidades estruturais da economia.
Jornal: As mudanças
de rumo do Banco Central na gestão Dilma estão contribuindo para agravar essas
vulnerabilidades?
Candidato: O Banco Central acumulou um conjunto de equívocos que
trouxeram perdas às aplicações financeiras de inúmeras famílias. Que segurança
o governo tem oferecido à sociedade brasileira? Tentou aproveitar-se da crise
para ganhar alguns votos e, mais uma vez, desqualificar as oposições, num
momento em que é necessário tranquilidade e compromisso com o Brasil.
Jornal: Está
sugerindo que as manobras da Presidente tentando convocar uma Constituinte, fazer
um plebiscito, convocar médicos cubanos de competência duvidosa, distribuir
mais dinheiro para os prefeitos são apenas maneiras de iludir o povo, fazendo
de conta que os protestos não são contra ela? Há uma conspiração em marcha?
Candidato: Como todos os brasileiros, quero a verdade completa.
Acredito que o atual governo colocou o país novamente em um impasse. O caminho
para superar a fragilidade das finanças públicas é aumentar e melhorar a
qualidade das exportações e promover uma substituição competitiva de
importações no curto prazo.
Jornal: O PT também
prometeu isso. E, pelo jeito, não fez nada. Como o senhor, se eleito, irá enfrentar
o problema?
Candidato: A reforma tributária, a política alfandegária, os investimentos
em infra-estrutura e as fontes de financiamento públicas devem ser canalizadas
com absoluta prioridade para gerar divisas. Superando a nossa vulnerabilidade
externa, poderemos reduzir de forma sustentada a taxa de juros. Poderemos
recuperar a capacidade de investimento público, tão importante para alavancar o
crescimento econômico.
Jornal: Reduzir a
taxa de juros é um bom tema de debate. Não foi isso que a atual presidente
prometeu fazer, apenas para voltar atrás, vergonhosamente, ao primeiro sinal de
que a inflação estava recrudescendo?
Candidato: Ninguém precisa me ensinar a importância do controle
da inflação. Iniciei minha vida política indignado com o processo de corrosão
do poder de compra dos salários dos trabalhadores. Quero agora reafirmar esse
compromisso histórico com o combate à inflação.
Jornal: As pesquisas
internas ao seu partido já dão como certa a vitória nas eleições presidenciais
de 2014. Que mensagem final o senhor gostaria de deixar, nesta entrevista, para
o povo brasileiro?
Candidato: O que nos move é a certeza de que o Brasil é bem
maior que todas as crises. O país não suporta mais conviver com a idéia de uma quarta
década perdida. O Brasil precisa navegar no mar aberto do desenvolvimento
econômico e social. É com essa convicção que chamo todos os que querem o bem do
Brasil a se unir em torno de um programa de mudanças corajosas e responsáveis.
REVELAÇÃO
Uma revelação final, também devida a
Edward Snowden: todas as respostas dadas pelo “Candidato” na entrevista acima foram
retiradas, literalmente, da “Carta ao Povo Brasileiro”, divulgada em 22 de
junho de 2002 pelo então candidato do PT à Presidência da República Luís Inácio
Lula da Silva. Mudei as referências a datas ou intervalos de tempo constantes do
texto original, substitui “vida sindical” por “vida política”, e corrigi os erros
de português mais graves, com a intenção de não entregar cedo demais ao leitor
o nome verdadeiro do “entrevistado”. O texto da “Carta ao Povo Brasileiro” está
em http://www.iisg.nl/collections/carta_ao_povo_brasileiro.pdf
(13/7/2013)
Gustavo Maia Gomes
Gustavo Maia Gomes
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