Compreender
fenômenos como esses só será possível depois de criarmos um novo ramo de
conhecimento, a economia da notoriedade sem causa. Ou, quem sabe, ele já
existe. Se não existe, os fatos e comentários alinhados abaixo poderiam servir
como pontos de partida desta inusitada ciência. Tenho a esperança de que eles
me façam ficar famoso, não apenas instantaneamente, mas para sempre.
DUAS
CONSIDERAÇÕES
Primeira,
uma reflexão sobre a velocidade e a extensão com que essas coisas ocorrem. Na
escala hoje conhecida, celebridades instantâneas seriam impossíveis se não
fosse a enorme redução que já houve e continua a haver dos custos de difundir e
consumir informação. Luíza deve seu estrelato aos feicebuques e tuíteres, cujo
acesso se tornou quase gratuito. O centroavante perna-de-pau dá entrevistas
diárias porque o minuto de rádio é ridiculamente barato, seja para os que falam,
seja para os que escutam. Sem a televisão, a gostosinha do Big Brother seria
apenas uma inútil a mais; com a TV vendida em 290 prestações, os idiotas que a
veêm diariamente (ou melhor, noturnamente) contam-se aos milhões.
Segunda,
uma hipótese sobre o “conteúdo” das celebridades instantâneas. Aqui, quase tudo
pode acontecer, desde o reconhecimento do heroísmo (o bombeiro flagrado ao
resgatar vítima de um desses prédios que vivem caindo no Rio de Janeiro) até a
ausência total de conteúdo (o exemplo emblemático é o de Luíza que nunca fez e,
se depender dos que exploram sua momentânea fama, nunca fará nada relevante). Sem esquecer aquela inglesinha recém-promovida
a princesa, elevada à condição de celebridade por ter-se casado com um parasita
hereditário.
ORDEM
NO CAOS
Mas,
mesmo nessa aparente anarquia do “conteúdo” das celebridades, alguma ordem
pode ser detectada. A chave parece ser que, em essência, a notoriedade instantânea
não depende do que a pessoa é, nem de se ela sabe fazer alguma coisa
socialmente útil; depende, sim, de se o público -- a massa da população, não um
subgrupo reduzido dela -- identifica ou não no candidato a famoso e nas suas circunstâncias
alguma coisa merecedora de atenção.
Imaginem,
agora, duas situações polares: (a) João das Botas é flagrado mantendo relações sexuais
com uma jumenta; (b) Andrew Wiles acaba de demonstrar o último teorema de
Fermat. A pergunta é quem, mais provavelmente, se tornaria instantaneamente
famoso: João das Botas ou Andrew Wiles?
Formular a pergunta já equivale a respondê-la. O importante, entretanto, é retirar as lições que o exercício
pode conter. Por exemplo: ter relações com animais é comum no Interior; qualquer
homem com suficiente coragem (a probabilidade de ser atingido por um coice da
jumenta é enorme) poderia fazer o que João das Botas fez. A notoriedade deste
senhor, portanto, não depende dele próprio, mas da avidez do público por
episódios deste tipo. Já o feito de Andrew Wiles somente foi conseguido depois
de 300 anos de tentativas fracassadas por parte dos melhores matemáticos que a
humanidade já produziu. Mas a resolução do problema de Fermat desperta o interesse
de muito poucas pessoas e, assim, Andrew Wiles nunca será uma celebridade que
faça sombra à gostosa do Big Brother. Muito menos a João das Botas.
MEU
SONHO
Encerro,
como comecei, com uma reflexão pessoal. Virar celebridade sempre foi meu sonho.
Inspirado nos aristóteles, voltaires, keynes e churchills -- que tenho por ídolos --,
estudei um bocado, tive cargos em governos, escrevi livros, publiquei artigos
venenosos em jornais de grande circulação. Debalde. E então vem a Luíza, e
compreendo quão errado eu estava.
Seja como for, o fenômeno paraibano me tem ajudado a manter viva a
esperança de ficar famoso. Vou ver se dá certo minha mulher, Lourdes, dizer, em
horário nobre da TV Globo: “aqui em casa, todos pagamos imposto. Menos Gustavo,
que está em cana.”
Dá?
Gustavo Maia Gomes
Gustavo Maia Gomes
Este artigo será publicado,
simultaneamente, em http://www.blogdatametrica.com.br, http://www.econometrix.com.br e http://www.gustavomaiagomes.blogspot.com (31/01/2012)
Sinceramente, esse tipo de texto não produz nada, não modifica nada, não contribui em nada. Vivemos num país em que a imensa maioria da população passa menos do que oito anos na escola. Não sabem quem é Fermat, Lavoisier, Pascal, Newton ou Eisntein. Não está ao seu alcance, portanto, não provoca interesse. Dessa forma, me surpreende que esses fenômenos causem surpresa em alguém, ainda mais num Ph. D em Economia. Não nos resta outra coisa além de continuar trabalhando e pensando maneiras de educar a população e construir um país de mais oportunidades. Estes textos, pra mim, são uma perda de tempo tão grande quanto uma sessão de Big Brother.
ResponderExcluirCaro Luiz Felipe: respeito sua opinião; obrigado pelo comentário. O senhor diz: uma população com menos de oito anos de escola não sabe quem é Fermat; portanto, meu artigo é "perda de tempo". Seguindo este raciocínio, posso concluir que o senhor tem menos de oito anos de escola? Se a resposta for sim, sua opinião está explicada. Assim como a minha, pois é claro que não escrevo para este público. Mas, também sou a favor de que ele ganhe muitos mais anos de escola.
ResponderExcluirTalvez eu não tenha sido suficientemente claro no meu comentário. Não acho que seu artigo seja uma perda de tempo por ter sido escrito para uma minoria. Acho que ele é uma perda de tempo porque não contribui em nada para modificar uma situação. Ele não propõe nada, não faz um paralelo com sociedades mais organizadas e intelectualmente desenvolvidas, não estabelece correlação entre e a "avidez do público por episódios deste tipo" e, por exemplo, o grau de educação deste mesmo público, que me parece ser uma área de estudo interessante para um economista. Reclamar, esbravejar e irritar-se com uma situação sem propor algo para alterá-la ou ao menos discuti-la, é que é, pra mim, a grande inutilidade. A não ser que o senhor queira usar o blog como espaço para desabafos pessoais. Aí sim eu entenderia e, obviamente, é um direito que o senhor tem. Quanto a minha escolaridade, passei um pouco mais que oito anos na escola. Sou engenheiro e estou concluindo minha pós-graduação. Pretendo continuar estudando.
ExcluirSr. Luiz Felipe: Seus comentários têm causado remorsos em pessoas as mais insuspeitas. Elas me mandam e-mails aflitos. Einstein. por exemplo: “perrgunta Herr Luiz se teorria relatividade também é perrda de tempo porque não contribui para modificarr situação”. Machado de Assis: “Carolina morreu e eu escrevi um soneto. Ele não propõe nada, não faz um paralelo com sociedades mais organizadas e intelectualmente desenvolvidas. Como pude ser tão casmurro?”. Pelé: “fiz 1200 gols, mas em nenhum deles estabeleci correlação entre e a avidez do público por episódios deste tipo e o grau de educação deste mesmo público. O que o engenheiro pensará de mim?”. Karl Marx: “de reclamar, esbravejar e irritar-se com uma situação eu entendo, mas meu livro não propõe nada para alterá-la, só fica dizendo que o capitalista vai se estrepar. Depois de ler o Sr. Luiz, descobri que O Capital é uma grande inutilidade”.
ExcluirFiquem frios, Albert, Joaquim, Edson, Karl. Não é nada disso. O problema é que o senhor Luiz quer usar o meu blog como espaço para os seus desabafos pessoais.
Este comentário foi removido pelo autor.
ExcluirFantástico! O senhor psicografa! Por que não não publica aqui os emails destes gênios então, seria muito interessante!
ExcluirA diferença entre seu texto e todos estes exemplos, é que a teoria da relatividade revolucionou a ciência e a eletrônica, a qual nos permite manter esse diálogo agora quase que instantaneamente. A obra de Machado se Assis é uma grande opção de lazer, nos invoca emoções e nos faz sentir vivos. Pelé fez coisas que qualquer amante do futebol sonharia em fazer. Marx propôs uma via. Todos nos fizeram algum bem. Qual o bem que o senhor nos traz?
Mas acho que o senhor tem razão, estou cometendo o mesmo erro que o blogueiro. Geralmente ignoro esses textos ranzinzas e inúteis. Desta vez cometi o erro de dar atenção.
Excelente e bem humorada reflexão Gustavo. Com um cumprimento, em particular, pela brilhante resposta ao comentário do Sr. Luiz.
ResponderExcluirDirijo este comentário aos meus leitores.
ResponderExcluirA polêmica com o engenheiro está encerrada. Aprecio receber críticas, quando elas questionam um argumento e, portanto, me dão oportunidade de melhorá-lo ou abandoná-lo. Mas esse senhor não contesta ideias; ele quer revogar meu direito de tê-las. Mao fez isso na China; Stálin, na Rússia; Hitler, na Alemanha.
Na minha segunda réplica, tentei mostrar que, se o mundo fosse obrigado a obedecer ao engenheiro, não apenas meu blog, mas toda a cultura ocidental teria de ser apagada. Sobrariam, apenas, livros de auto-ajuda. São umas porcarias, mas transformam o mundo.
Gustavo Maia Gomes