Washington Novaes é jornalista.
Até onde sei, dos bons. Mas não é especialista em Nordeste, muito menos, em
seca ou semiaridez. De certa forma, portanto, devemos perdoar seus enganos. No artigo "O Semiárido ergue as mãos para o alto" (O Estado de São Paulo, 11 de outubro de 2013, disponível em http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,o-semiarido-ergue--as-maos-para-o-alto-,1084491,0.htm), ele
apenas repete a sabedoria convencional, ou seja, a burrice vastamente compartilhada. Sob a aparência de
proposições quase autoevidentes, o texto esconde muita bobagem.
Seleciono quatro delas,
para comentar.
1. Convivência com a seca. Virou moda dizer
que descobrimos a pedra filosofal. Que não se trata de “combater a seca”, mas de
conviver com ela. Grande besteira. Convivência com a seca não é nenhuma novidade.
O primeiro açude de
grande porte no Nordeste (Cedro, em Quixadá, CE) começou a ser construído no
Império e foi inaugurado em 1906. É a mais antiga representação da velha
política. Alguém pensava, naquela época, que o açude iria fazer chover no
Sertão? Claro que não. A idéia era que a água acumulada evitaria que o
sertanejo morresse de sede, quando a chuva faltasse. O que é isso, se não
"conviver com a seca"? E o que estamos fazendo hoje, com cisternas e
transposições, senão melhorar a "convivência" do sertanejo com a
seca?
Ariano Suassuna não
tem com que se preocupar: ninguém jamais tentou combater o gelo na Sibéria. E nem
extinguir a seca por decreto. Nem mesmo a Inspetoria de Obras Contra as
Secas (1909) tinha tal pretensão.
2. Desertificação. O discurso da desertificação
do Nordeste é uma espécie de primo pobre daquele outro, do aquecimento global. É
pobre, mas não tem inveja do rico. Até tenta imitá-lo, na esperança de
abocanhar umas migalhas da dinheirama que financia o primeiro.
Não estou brincando:
se a tese do aquecimento global é duvidosa, seus simpatizantes, pelo menos,
dizem que fazem pesquisas científicas e que seus alertas se baseiam nos resultados dessas
pesquisas. A turma de cá anuncia o fim do mundo baseada em pesquisa nenhuma. É
uma fraude. E o pior é que a desertificação (jamais nos níveis que eles dizem)
talvez até exista, no Semiárido.
Nunca iremos saber disso, se nos limitarmos
a repetir chavões.
3. Fogão ecológico. Quem pode ser contra
um fogão ecológico? Ninguém. Por outro lado, que desgraça alguém acha que o
fogão ecológico vai evitar ou resolver? O problema do sertanejo não é como
economizar três gravetos dos dez que ele ainda encontra pelos caminhos, quando precisa
cozinhar. Seu problema não é se ele precisa de dez ou de sete gravetos. Seu
problema é precisar de gravetos.
Se tivesse renda,
teria um fogão a gás. Se isso fosse julgado inadequado, um pouquinho mais de
pesquisa científica é tudo o que falta para viabilizar a energia eólica ou
solar barata, não apenas no sertão. Aí, sim, teríamos os verdadeiros fogões
ecológicos que economizariam não trinta, mas cem por cento dos gravetos.
4. Soja nos cerrados. A ideia de que o
avanço da soja nos cerrados piora as condições sociais nas áreas em que ocorre
soa bem aos ouvidos, mas é falsa, absurda e amplamente desmentida pelos fatos.
Muitos de nós
conhecemos as "condições sociais" nos lugares do Sertão onde não há
soja (nem fruticultura irrigada, nem pólos de confecções...) Agora visitem
qualquer uma das cidades onde haja atividade econômica de alta produtividade,
seja ela o cultivo de soja ou qualquer outra. A diferença em condições sociais
é chocante, a favor da soja (ou da fruticultura irrigada, ou das confecções...).
Um dado
interessante: Barreiras, BA, um dos principais pólos da soja, tem 9,3
beneficiários do Bolsa Família para cada cem habitantes. É muito? Talvez
seja, mas, dos 413 municípios baianos, somente nove têm menos beneficiários (em
%) do que Barreiras. Pelo menos um destes municípios (Luís Eduardo Magalhães)
também é um polo de soja.
Sabe o que isso
significa? Há menos pobres lá. O pessoal encontra formas produtivas de ganhar a
vida e não precisa do auxílio assistencialista.
É ruim?
Pra quem vive de trocar
um dinheirinho de nada por uma montanha de votos, é péssimo.
Gustavo Maia Gomes
(1 nov 2013)
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