A
Escócia quer ser independente; a Catalunha quer ser independente; alguns
jornalistas mal informados e economistas que erraram as contas voltam a brincar
com a ideia de que o Nordeste brasileiro se torne independente.
Nada tenho a dizer sobre a Escócia ou a Catalunha.
Mas, um Nordeste transformado em país sob a justificativa de que nossa pobreza
(sim, sou nordestino — e moro no Recife) se explicaria pela suposta
"exploração" por parte do Sudeste, esse Nordeste seria um sério
candidato a Haiti.
Ao
contrário de ser explorado, o Nordeste vem recebendo há décadas transferências
líquidas de renda (e/ou de capitais) do restante do país. (Ou do mundo, mas
essas entradas internacionais têm magnitude desprezível.)
O
indicador mais claro de que somos recebedores líquidos de transferências é que
temos tido um persistente saldo negativo na balança comercial, tanto com as
demais regiões quanto com o resto do mundo. (O comércio interregional é mal
coberto pelas estatísticas brasileiras, mas as poucas que existem me permitem
afirmar isso.)
Até
dez ou vinte anos, tínhamos saldo comercial positivo com o resto do mundo
(porém negativo — e maior, em valor absoluto — com as demais regiões). Desde
então, somos deficitários nos dois comércios. O financiamento desse duplo
déficit, por definição, só pode se dar pela entrada líquida de recursos vindos
de outras regiões ou de outros países.
Reconhecer
isso não equivale a reservar ao Nordeste o papel de bandido, enquanto as demais
regiões seriam os "mocinhos" do filme. Significa dizer que não
podemos explicar nossa pobreza nesses termos simplórios de "quem rouba
quem". O Haiti pensou que podia e se lascou.
O
Nordeste tem um crédito enorme com as demais regiões (especialmente, o Norte da
borracha e o Sudeste da indústria) como fornecedor de mão de obra
não-especializada. De certa forma, o Brasil tem um débito enorme com os
nordestinos (para ser sincero, não apenas com os nordestinos!) por nunca lhes
ter oferecido uma educação obrigatória, universal e de qualidade, que os
credenciasse a ser produtivos e ricos, fazendo com que a região também se
tornasse rica e produtiva.
Por
esse caminho — o de romper as condições estruturais que, realmente, explicam
nossas dificuldades — podemos iniciar uma discussão potencialmente frutífera
sobre a riqueza e a pobreza das regiões. A velha conversa de "coitadinho
pra cá, coitadinho pra lá", só nos levará, mesmo, a continuar dependendo
do dinheiro alheio.
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