Gustavo Maia Gomes
Querido Tempranillo
Ao seu lado, suportei calor e
frio, péssimas companhias, gente lhe levando para as bebedeiras. Com o coração
partido, tantas vezes, ouvi mulheres sussurrando, após lhe tocar com os lábios:
“tão encorpado!”, “essas frutas vermelhas!”, “ah, o retrogosto!”
E eu, Tempra? E eu? Esquecida
na adega. Se o garçon me pegava, era só para me tirar da frente e chegar ao
Cabernet Sauvignon. (Pretensioso, mas vai sair de moda. Juro.) Ou aos Rosés.
(Quem disse que Rosé é vinho?) Ou ao Merlot, aquele chato metido a besta.
Na manhã seguinte, você
voltava, vestindo garrafa nova. Com o corpo quente. Eu dizia, baixinho, em
minha tola esperança: “ele vai me aquecer”. Que nada. Nem uma palavra, um gesto
de carinho. Seu interesse único era se refrescar para a próxima farra.
Ah, Tempra! Como eu queria ter
sentido seu tanino, seu frutado, seus toques de carvalho. Nunca os tive em mim.
Tudo o que você tão alegremente oferecia às mulheres, a mim, negava.
Não aguento mais, meu amor. É
o fim. Vou virar vinagre.
Da sua, sempre,
Carmenere
(Publicado
no Facebook, 31/8/2019)
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