Gustavo Maia Gomes
Pensei: há 25 anos não durmo
naquela casa. Seria bom repetir a experiência, antes de terminar meu novo
livro, que tem Anhumas no título. Pois consegui. As Izabel Maia Gomes, mãe e
filha, deram a Lourdes e a mim dois dias a serem lembrados.
Ficamos agradecidos e
reflexivos. Em 1952, Carlos Galhardo gravou a valsa “Bodas de Prata”. Começava
assim: “Beijando teus lindos cabelos / Que a neve do tempo marcou / Eu tenho
nos olhos molhados / A imagem que nada mudou”.
Não sou piegas, não beijei
cabelos que a brisa de Anhumas marcou, nem tive os olhos molhados, exceto ao
tomar banho na velha casa. (“Isso não vale”, diria o cantor.) Mas há verdade na
imagem-desejo de que nada mudou.
Exagero, claro. Muita coisa
não é como foi. A matriarca Helena Bahia não mora mais ali. Desapareceram as
doces laranjas de que meu pai tanto falava. (Em compensação, bananas-compridas
abundam.) Já ninguém chega à fazenda desembarcando pela estação do trem em
União.
Mesmo assim, num sentido
importante, nada mudou. É a casa. É a permanência de uma casa robusta,
imponente, linda, que está ali, fundamentalmente inalterada, há 130 anos. Na
posse dos Maia Gomes -- a começar por Benon, marido de Helena --, desde 1933.
Um século, quase.
Atuais proprietários, os
Padilha Maia Gomes cogitam abrir o lugar para turistas. Acho ótimo. Atrações
históricas não faltam. Em adição a elas, conviria arranjar almas penadas e uma
mula sem cabeça para a casa do antigo engenho. Perna Cabeluda e Papa Figo,
igualmente, ajudariam. Turismo sem aparições sobrenaturais muita gente promove.
Já com o aperitivo de uma assombração ocasional, ave Maria!
Não estaríamos sozinhos. Os
escoceses cultuam o monstro do lago Ness (conseguiram até uma fotografia dele);
não faltam fantasmas em castelos ingleses; o ET de Varginha ainda tem
serventia. Imaginem quando o mundo soubesse que da antiga senzala de Anhumas
emanam gemidos noturnos.
Como o espírito de Zumbi
habita as redondezas, ele também poderia colaborar com essa iniciativa de
desenvolvimento local sustentável, integrado, orgânico, sistêmico, inclusivo e
não-homofóbico (vejam como estou atualizado) do turismo em Alagoas. Posso
antecipar a maravilha de ver multidões disputando uma vaga para conhecer
Anhumas.
É só uma sugestão. Não quero
interferir. Antes que seja tarde, volto ao tema incontroverso. A música.
“Estavas vestida de noiva / Sorrindo e querendo chorar / Feliz, assim, olhando
para mim / Que nunca deixei de te amar”.
Mas, esperem! Refiz as contas:
não se passaram só 25 anos entre lá atrás e esses dois dias na fazenda Anhumas.
Foram 35! Fui ver no Google: “Bodas de Coral”.
E aí, Galhardo, vai outra
valsa?
(Publicado
no Facebook, 13/9/2019)
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