quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Juros também visam captar dinheiro estrangeiro

Artumira Dutra
O Povo, Fortaleza, 28/11/2013







O economista Gustavo Maia Gomes diz que o aumento da taxa de juros favorece os objetivos de trazer dinheiro novo para o Brasil e de aumentar a credibilidade do País, além de controlar a inflação. “Juros maiores aumentam a atração para a vinda de capitais de curto prazo e, portanto, contribuem para trazer mais dinheiro de fora”, diz. Com isso, explica Gomes, a alta dos juros serve para atenuar o déficit nas contas nacionais, além de minimizar os efeitos da valorização do dólar.
Ele explica que o retorno a um regime mais ortodoxo de política monetária (juros altos, em resposta ao aumento da inflação) também faz elevar a credibilidade do País diante do mercado internacional. “Os bancos e administradores de fundos gostam de duas coisas: juros altos e segurança de que não haverá bruscas mudanças de política. A elevação dos juros sinaliza a disposição do Governo de adotar políticas impopulares”.

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Nordeste em pauta: a reunião de Fortaleza

Um grupo de estudiosos esteve reunido (dias 21 e 22/11/13) na sede do Banco do Nordeste, em Fortaleza. Discutimos trabalhos ainda em elaboração sobre a economia regional. Antônio Márcio Buainain, da Unicamp, presente ao encontro, teve a gentileza de comentar, em artigo n'O Estado de S. Paulo, minha própria contribuição.

O artigo de Buainain está em 
(Publicado no Facebook, em 26/11/2013)

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

"A seca" ou "Nem todas as estatísticas são frias"

Gado morto à beira da BR-232, próximo a Serra Talhada, PE.
(Foto de Daniel Maia Gomes, 13/1/13)
Números não mentem: no Semiárido nordestino, em 2012, foram perdidos 80% da produção de feijão, 66% da produção de milho e 40% da de mandioca. Repito: 80% da produção de feijão, 66% da produção de milho e 40% da de mandioca foram perdidos, no ano passado, nos sertões e agrestes, devido à estiagem prolongada.
Não foi tudo: os rebanhos bovino, caprino e ovino diminuíram 9%, 8% e 6%, nesta ordem. A produção de leite caiu 17%. (Todas as comparações são entre o valor medido em 2012 e a média dos valores da mesma variável nos três anos anteriores.) Mais uma vez, a seca devasta a pequena produção agrícola não irrigada e a pecuária nos sertões e agrestes nordestinos. Devasta, sim, pois ainda não acabou.
Somente agora, com a divulgação pelo IBGE, (em 25/10/13), dos resultados da “Produção Agrícola Municipal” e da “Pesquisa Pecuária Municipal” relativas a 2012, foi possível fazer esses cálculos. Mas, como a estiagem se prolongou por 2013, e ainda não se sabe se não continuará no próximo ano, os números relatados são apenas uma parte dos prejuízos que a seca tem trazido. Praticamente, todas essas perdas – que abalam a vida de uma parcela grande da população sertaneja – são absorvidas pelos próprios agricultores e pecuaristas pobres e por suas famílias. O governo socorre com um caminhão-pipa aqui, uma bolsa estiagem ali, uma bolsa família em todos os lugares. Mas isso é um pequeno alívio, insuficiente, vexaminoso. Enquanto isso, a tragédia segue seu curso, matando o que ainda encontra pela frente.
CASOS CRÍTICOS
Houve, por trás das médias, casos, especialmente, dramáticos. A produção de feijão foi reduzida a zero em 326 municípios que, normalmente, são produtores do grão. Em 422 municípios que, em anos de chuvas, produzem milho, não se colheu sequer uma espiga. O mesmo aconteceu – ou seja, produção nenhuma, nada, zero – em 162 municípios que, normalmente, produzem mandioca.
Mais casos críticos.
Os agricultores de Senador Elói, Rio Grande do Norte, produziram 224 toneladas de feijão, em 2011, e apenas uma tonelada, em 2012. Em Ibiara, Paraíba, as perdas foram ainda maiores: as 283 toneladas de feijão produzidas em 2011 se transformaram em apenas uma, em 2012. Em Mata Grande, Alagoas, a produção de feijão havia sido de 649 t, em 2011; reduziu-se a 4 t, no ano seguinte. Condeúba, Bahia, produziu 1.680 t de feijão, em 2011; não mais do que 7 t, em 2012. Monsenhor Tabosa, Ceará, viu sua produção de 2.792 t, em 2011, se reduzir a 12 t, em 2012.
Na cultura da mandioca, houve muitas situações do mesmo tipo. Belém do São Francisco produziu 360 t, em 2011; uma tonelada, em 2012. Cipó, Bahia: 1.080 t, no ano de boas chuvas (2011); 20 t, no ano de seca. Em Bento Fernandes, Rio Grande do Norte, a produção despencou de 5.880 t para 50 t. Em Ielmo Marinho, também no Rio Grande do Norte, as 6.000 t de 2011 viraram 200 t de 2012.
Quanto ao milho, os agricultores de Pesqueira (PE) haviam produzido 1.500 t, em 2011; produziram apenas uma tonelada, em 2012. Ibicuitinga, Ceará, viu sua produção desaparecer: 2.736 t para 6 t. Os agricultores de Monsenhor Tabosa (CE) viveram a mesma tragédia: o município que produzira 8.831 t de milho, em 2011, colheu meras 21 t, um ano depois.
Na produção de leite, embora esta não tenha sido reduzida a zero em nenhum município, alguns casos individuais merecem registro. Entre muitos outros, os de Gurjão e São Domingos, na Paraíba, e Itaíba, em Pernambuco. Gurjão, pequeno produtor, havia produzido 1.300 litros de leite em 2011. Em 2012, sua produção foi um quarto disso: 265 litros. São Domingos esteve no mesmo caso: 1.375 litros, em 2011; 378 litros, um ano depois. Em Itaíba, município maior produtor do Semiárido (tanto em 2011 quanto, apesar do desastre, também em 2012) a produção caiu de 102.283 litros para 59.625 litros.
VACAS POLÍTICAS
A variação dos rebanhos também foi, em muitos casos, dramática. Em Pacoti, Ceará, havia 3.564 cabeças de boi, em 2011; apenas 836, em 2012; em Betânia, Pernambuco, 10.000 bois e vacas, no ano de 2011, deram lugar a apenas 5.309, em 2012. Em Vertente do Lério, Pernambuco, o rebanho caprino era de 1.500 cabeças, em 2011; passou a 461, no primeiro ano da seca. No mesmo município, havia 1.700 carneiros e ovelhas, em 2011; um ano depois, os pesquisadores do IBGE só encontraram 280. Uma parte desses animais foi vendida a preços vis, ou sacrificada fora de hora. Outra parte, talvez, maior, morreu de fome e sede.
A dizimação dos rebanhos provocou perdas de capital que os pequenos pecuaristas levarão anos para recompor, se é que conseguirão. Aqui, também, faltou governo. O gado morreu em pé, devagar, uma vaca por vez. E não apareceu ninguém que evitasse isso. Impossível, não era. Para usar um jargão que a turma hoje instalada em Brasília tanto gostava de usar contra seus adversários: faltou “vontade política”.
E a seca, repita-se, ainda não acabou.
Semiárido nordestino, 2009-12
Efeitos da seca de 2012 sobre a produção de feijão, mandioca, leite e sobre os efetivos de rebanhos bovino, caprino e ovino
Item
 Unidade de medida
Média 2009-11
2012
Quebra % em relação à média 2009-11
Observações
Feijão
Quantidade produzida em t
591.914
120.567
79,6
326 municípios normalmente produtores tiveram produção zero em 2012
Milho
Quantidade produzida em t
2.234.946
758.459
66,1
422 municípios normalmente produtores tiveram produção zero em 2012
Mandioca
Quantidade produzida em t
3.693.299
2.222.645
39,8
162 municípios normalmente produtores tiveram produção zero em 2012
Efetivo do rebanho bovino
Cabeças
15.080.612
13.725.009
9,0
Rebanho não zerou em nenhum município onde havia algum estoque nos anos anteriores à seca
Efetivo do rebanho caprino
Cabeças
7.197.589
6.648.094
7,6
Rebanho não zerou em nenhum município onde havia algum estoque nos anos anteriores à seca
Efetivo do rebanho ovino
Cabeças
8.618.095
8.119.970
5,8
Rebanho não zerou em nenhum município onde havia algum estoque nos anos anteriores à seca
Leite
Mil litros
15.080.612
13.725.009
17,3
Produção não zerou em nenhum município, mas houve casos de perdas acima de 75%
Fonte: IBGE, Produção Agrícola Municipal e IBGE, Pesquisa Pecuária Municipal

Gustavo Maia Gomes

(6 nov 2013)

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Pensando errado sobre seca e Semiárido

Washington Novaes é jornalista. Até onde sei, dos bons. Mas não é especialista em Nordeste, muito menos, em seca ou semiaridez. De certa forma, portanto, devemos perdoar seus enganos. No artigo "O Semiárido ergue as mãos para o alto" (O Estado de São Paulo, 11 de outubro de 2013, disponível em http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,o-semiarido-ergue--as-maos-para-o-alto-,1084491,0.htm), ele apenas repete a sabedoria convencional, ou seja, a burrice vastamente compartilhada. Sob a aparência de proposições quase autoevidentes, o texto esconde muita bobagem. 

Seleciono quatro delas, para comentar.

1. Convivência com a seca. Virou moda dizer que descobrimos a pedra filosofal. Que não se trata de “combater a seca”, mas de conviver com ela. Grande besteira. Convivência com a seca não é nenhuma novidade.
O primeiro açude de grande porte no Nordeste (Cedro, em Quixadá, CE) começou a ser construído no Império e foi inaugurado em 1906. É a mais antiga representação da velha política. Alguém pensava, naquela época, que o açude iria fazer chover no Sertão? Claro que não. A idéia era que a água acumulada evitaria que o sertanejo morresse de sede, quando a chuva faltasse. O que é isso, se não "conviver com a seca"? E o que estamos fazendo hoje, com cisternas e transposições, senão melhorar a "convivência" do sertanejo com a seca?
Ariano Suassuna não tem com que se preocupar: ninguém jamais tentou combater o gelo na Sibéria. E nem extinguir a seca por decreto. Nem mesmo a Inspetoria de Obras Contra as Secas (1909) tinha tal pretensão.
2. Desertificação. O discurso da desertificação do Nordeste é uma espécie de primo pobre daquele outro, do aquecimento global. É pobre, mas não tem inveja do rico. Até tenta imitá-lo, na esperança de abocanhar umas migalhas da dinheirama que financia o primeiro.
Não estou brincando: se a tese do aquecimento global é duvidosa, seus simpatizantes, pelo menos, dizem que fazem pesquisas científicas e que seus alertas se baseiam nos resultados dessas pesquisas. A turma de cá anuncia o fim do mundo baseada em pesquisa nenhuma. É uma fraude. E o pior é que a desertificação (jamais nos níveis que eles dizem) talvez até exista, no Semiárido. 
Nunca iremos saber disso, se nos limitarmos a repetir chavões.
3. Fogão ecológico. Quem pode ser contra um fogão ecológico? Ninguém. Por outro lado, que desgraça alguém acha que o fogão ecológico vai evitar ou resolver? O problema do sertanejo não é como economizar três gravetos dos dez que ele ainda encontra pelos caminhos, quando precisa cozinhar. Seu problema não é se ele precisa de dez ou de sete gravetos. Seu problema é precisar de gravetos.
Se tivesse renda, teria um fogão a gás. Se isso fosse julgado inadequado, um pouquinho mais de pesquisa científica é tudo o que falta para viabilizar a energia eólica ou solar barata, não apenas no sertão. Aí, sim, teríamos os verdadeiros fogões ecológicos que economizariam não trinta, mas cem por cento dos gravetos.
4. Soja nos cerrados. A ideia de que o avanço da soja nos cerrados piora as condições sociais nas áreas em que ocorre soa bem aos ouvidos, mas é falsa, absurda e amplamente desmentida pelos fatos.
Muitos de nós conhecemos as "condições sociais" nos lugares do Sertão onde não há soja (nem fruticultura irrigada, nem pólos de confecções...) Agora visitem qualquer uma das cidades onde haja atividade econômica de alta produtividade, seja ela o cultivo de soja ou qualquer outra. A diferença em condições sociais é chocante, a favor da soja (ou da fruticultura irrigada, ou das confecções...).
Um dado interessante: Barreiras, BA, um dos principais pólos da soja, tem 9,3 beneficiários do Bolsa Família para cada cem habitantes. É muito? Talvez seja, mas, dos 413 municípios baianos, somente nove têm menos beneficiários (em %) do que Barreiras. Pelo menos um destes municípios (Luís Eduardo Magalhães) também é um polo de soja.
Sabe o que isso significa? Há menos pobres lá. O pessoal encontra formas produtivas de ganhar a vida e não precisa do auxílio assistencialista. 
É ruim? 
Pra quem vive de trocar um dinheirinho de nada por uma montanha de votos, é péssimo.
Gustavo Maia Gomes

(1 nov 2013)