terça-feira, 29 de novembro de 2016

CA(tá)STRO(fe)



Como ícone político, Fidel Castro (mas, não apenas ele) representou a junção de duas ideias que, com a passagem do tempo, se revelaram catastróficas para a humanidade:

(1) Uma pessoa (ou classe social, ou país) é pobre porque outra pessoa (ou classe social, ou país) é rica e a explora.

(2) A igualdade, obtida pela eliminação da exploração e a oferta de serviços públicos gratuitos, é o principal indicador de justiça de uma sociedade.

A primeira ideia me exime de qualquer responsabilidade por minha pobreza. Portanto, eu (pessoa) não tenho que trabalhar mais, ser mais cioso de meus deveres, estudar, me qualificar. Basta-me encontrar quem me está roubando e matá-lo. Portanto, eu (país) não tenho que criar leis e ensinar valores (como o respeito ao lucro honesto) que assegurem a liberdade econômica e incentivem a produção. Basta-me culpar a burguesia, o colonialismo, o imperialismo e expulsá-los todos de meu território.

A segunda ideia implica que a distribuição é mais importante que a produção. Também implica que devemos preferir a igualdade dos pobres (ou seja, uma sociedade em que todos são igualmente miseráveis) à desigualdade dos ricos (ou seja, uma sociedade onde há pobres e ricos, mas, mesmo os que têm menor renda ganham mais do que os habitantes da sociedade igualitária). 

Mao, Stálin, Hitler e Fidel 

A primeira ideia levou Fidel Castro a expropriar o patrimônio de empresas estrangeiras (e nacionais), assim como lhe possibilitou "explicar" quase sessenta anos de pouca ou nenhuma melhora na pobreza de Cuba pelo bloqueio comercial imposto pelos EUA (uma política, certamente, burra), ao mesmo tempo em que seu regime ditatorial impunha desestímulos absolutos (leia-se: socialismo) à geração interna de riquezas.

A segunda ideia, facilmente vendável a compradores incautos, permitiu a Castro fuzilar os opositores, eliminar a liberdade de expressão, eternizar-se no poder — tudo em nome da implantação de uma sociedade onde não houvesse exploradores —, assim como se redimir dos seus crimes pela oferta gratuita de serviços de saúde e de educação para os cubanos que não contestassem o regime político.

Isso parece fantástico, mas as tentativas anteriores (que Fidel conhecia) de implantar sociedades sem "exploradores" tinham resultado na China de Mao (milhões de mortos em consequência da coletivização da agricultura), na União Soviética de Stálin (milhões de ucranianos mortos pela expropriação de suas colheitas) e na Alemanha de Hitler (milhões de judeus mortos no Holocausto).

Além disso, no caso da tirania de Fidel, vale lembrar que:

(a) A saúde é um bem infinitamente valioso, sim, mas não era necessário manter o país na miséria para oferecer bons serviços de saúde ao povo. A Inglaterra, por exemplo, faz isso melhor do que Cuba e é um bocado mais rica. Também não há fuzilamentos políticos naquele país, nem ditadores eternos.

(b) A educação é um bem muito valioso, sim, principalmente, quando podemos ler não apenas placas de ônibus e propaganda do governo, mas boa literatura e notícias verdadeiras, não censuradas. Tampouco adianta muito formar-se em medicina e, depois, ter como única opção profissional vir trabalhar no Brasil como escravo de ganho.

Oferecer saúde e educação para o povo e, em troca, garantir seis décadas de exercício incontestado de poder é um negócio que, se fosse proposto nesses termos, seria aceito por qualquer canalha. Como Fidel Castro, por exemplo.

(Publicado no Facebook, 27/11/2016)

A boiada e os pensadores



(A José Adalberto Ribeiro, que deu o mote para os versos)


Augusto Pinochet pegou o Chile com uma economia destroçada e a endireitou em pouco tempo. É execrado como um neoliberal. Fidel Castro pegou Cuba com uma economia florescente e a destruiu para sempre. É enaltecido como um estadista.

Augusto Pinochet tomou o poder pelas armas e mandou matar seus adversários. É considerado assassino. Fidel Castro tomou o poder pelas armas e mandou matar seus adversários. É considerado herói.

Augusto Pinochet foi ditador durante 17 anos. A boiada o condena como tirano. Fidel Castro foi ditador durante 50 anos. A boiada o elogia como benfeitor dos cubanos.

Uns poucos bois não concordam. Eles acham que Augusto Pinochet foi um canalha. Eles acham que Fidel Castro foi um canalha.

(Publicado no Facebook, 29/11/2016)

quarta-feira, 23 de novembro de 2016

O casamento de Fernando Maia Gomes e Maria Moreira Calheiros



Jornal do Recife, 13/10/1918, pág. 1
“ -- Foi a nota chique e elegante da semana”, escreveu o correspondente em Alagoas do Jornal do Recife, na primeira página da edição de domingo 13 de outubro de 1918. Ele se referia ao casamento do major Fernando Maia Gomes com Maria Moreira Rodrigues Calheiros, relatado numa matéria longa, que, a partir do subtítulo O feliz enlace matrimonial, transcrevo, atualizando a grafia e fazendo adaptações mínimas. (Dispenso as aspas. O que estiver entre colchetes [...] é adição ou comentário meu.) 

Fernando Maia Gomes (1885-c.1970) foi irmão de meu avô Nominando Maia Gomes (1887-1966), assim como de José (1874-1946), Alípio (1878-1916), Eulália (Sinhá), Juvenal, Jovino, Amélia, Amália, Frigdiano e Antonio. Seu casamento com Maria Moreira Calheiros (conhecida como Maroquinha), foi o segundo dele. A primeira mulher de Fernando (Afra Lopes Ferreira de Omena) morreu jovem, de parto. Não deixou descendentes. Afra era irmã de Ester e de Eudócia. 

Eudócia foi a esposa de José Maia Gomes, cujo nome (até ser oficialmente mudado) tinha sido José Gomes de Oliveira Maia. Ester, por sua vez, foi casada, primeiro, com Antonio Maia Gomes e, após enviuvar, com Mário Gomes de Barros, filho de Amália (irmã de Antonio), e de Laurentino Gomes de Barros, primo dos Maia Gomes. A mulher de Juvenal, Francisca, era irmã de Laurentino.
 
Os Calheiros (cuja família tem representantes destacados -- e controversos -- na política, por exemplo, Renan Filho, governador de Alagoas; Renildo, prefeito de Olinda, PE; Renan, presidente do Senado Federal) se entrelaçaram mais de uma vez com os Maia Gomes. Além de  Maria ter desposado Fernando, Manoel Rodrigues Calheiros, seu irmão (de Maria), casou-se com Luíza Maia Gomes, filha de José. Há, com certeza, outros casos.

E assim, primos casando com primas, sobrinhos com tias, foi ficando tudo como dantes, no quartel de Abrantes. Pelo menos, até os índios tomarem o forte.


O feliz enlace matrimonial (Jornal do Recife)


Sábado último, realizou-se, no engenho Pau Amarelo, do município de Santa Luzia do Norte [AL], o feliz enlace matrimonial do distinto moço senhor major Fernando Maia Gomes, proprietário do engenho Campo Verde, no Nicho, com a gentilíssima senhorita Maria Moreira Rodrigues Calheiros, irmã dos estimáveis senhores José Rodrigues Calheiros, Joaquim, Mário e Manoel Rodrigues Calheiros e filha do saudoso coronel Manoel Galdino Calheiros.

Desta cidade [possivelmente, Maceió] para a estação de Lourenço de Albuquerque seguiram numerosas pessoas de destaque social, em trem da Great Western que se destinava a Quebrângulo. Em viagem, um grupo de distintos moços resolveu organizar uma sociedade, a fim de, no engenho Pau Amarelo, serem levadas a efeito atraentes e agradáveis diversões.

Essa sociedade tomou o nome de Liga dos Desmastreados, ficando eleita e empossada a seguinte diretoria: presidente, Luís do Rego; vice-presidente, acadêmico de engenharia Olivério de Souza Campos; secretário, Otaviano Wanderley e orador o nosso confrade da imprensa Agerico Vieira. Foram, ainda, eleitos “fiscais” da Liga os senhores Pedro Wanderley, engenheiro Jaime de Souza, Carlos Martins, acadêmico Alísio Goulart e o simpático tenente J. C. Argollo.

Aclamada a diretoria acima, houve palmas e vivas em profusão. Em seguida, foram improvisados vários folguedos. Reinava muita alegria e satisfação. Chegados todos a Lourenço de Albuquerque, lugar de onde deveriam ser transportados para o engenho Pau Amarelo, houve alguma demora. O trem especial da G.W.B.R. [Great Western of Brazil Railway] apareceu-nos após duas horas e minutos.

Vários membros das distintas famílias dos nubentes solicitavam desculpas da estupenda demora, resultado da má direção que se nota na seção de Alagoas que é dirigida pelo sr. Antonio Justino. E todos se expressavam: “Essa Great Western é assim mesmo”.


Pessoas destacadas


Dentre o grande número de excursionistas, destacavam-se os seguintes: Sra. d. [Dona] Santa Oiticica, Mmes. [mesdames, plural de madame] Dr. Quintella Cavalcanti, João Lauria, Dr. Alfredo Oiticica, Hermínio Xavier de Almeida, Juvenal Maia Gomes, José Gomes de Oliveira Maia [nome de batismo, depois modificado para José Maia Gomes], major Francisco Oiticica, Dr. Nominando Maia Gomes, Mlles. [Mesdemoiselles, plural de mademoiselle] Stella Moreira, Olívia de Barros, Nadir Maia Gomes, Arthemia Moreira, Maria Amália Barros, Luzia Maia Gomes [sic. Seria Luíza Maia Gomes?], Maria Eulália Quintella Cavalcanti, Maria do Carmo Lins, Nita Rocha, Gerusa Gomes, Adelaide Lins, Marieta Rocha, Hermínia Lins e muitas outras graciosas.

No engenho Pau Amarelo, todos foram fidalgamente recebidos pelas Exas. [excelentíssimas] famílias Maia Gomes e Rodrigues Calheiros. Após pequeno repouso, foi servido aos presentes farta mesa de doces finos e licores. Cerca de 14 e meia horas, num altar artisticamente armado e confeccionado na alcova da aprazível vivenda, pelas senhoritas Maria José e Maria de Lourdes Moura, o revmo. [reverendíssimo] padre Aurélio Henrique, vigário da freguesia de Rio Largo, celebrou solene missa, após a qual teve lugar o consórcio do Sr. major Fernando Maia Gomes [o redator não menciona o nome na noiva, neste ponto.]

Serviram de paraninfos: por parte da noiva o Sr. coronel Manoel Gomes dos Santos, representando o Sr. Dr. Quintella Cavalcanti, e a Exa. Sra. d. Laura Duarte Quintella Cavalcanti, esposa deste, e por parte do noivo, o Sr. Dr. Pedro Duarte e Exa. consorte d. Rosita Duarte e Dr. Alfredo Oiticica e sua digna consorte d. Clotilde Oiticica.


Convidados


Após essa cerimônia que se revestiu de toda solenidade, o revmo. padre Aurélio Henrique pronunciou uma tocante preleção. Em seguida, teve lugar o casamento civil. Esses atos foram religiosamente assistidos por todas as pessoas que seguiram desta cidade [Maceió] e por grande número de distintos cavalheiros e Exas. famílias que ali se achavam.

Dentre os convidados, notavam-se os seguintes: Mme [Madame] major Demétrio Moura, Sra. d. Joana Calheiros, Mme. major Manoel Serapião Calheiros, senhoritas Maria José e Maria de Lourdes Moura, Leonídia Calheiros, coronel Guilherme Calheiros, major Pedro Calheiros, José Cândido Coelho, Carlos Diniz, coronel Aristides Agra, Dr. José Rodrigues, acadêmico Manoel Calheiros, Dr. Firmino Peixoto, Dr. Pedro Duarte, jornalista Pedro Xavier, Crispim Rocha, Lauro Lima, Pedro Rocha, major Manoel Serapião Calheiros, Oscar Duarte, Luís Medeiros, Mário Calheiros, e muitos outros que nos escaparam à memória.

Após as cerimônias, realizou-se lauto almoço, regado a finos e generosos vinhos. “Au desert”, falaram várias pessoas, entre as quais o jornalista Pedro Xavier, o jovem Mário Calheiros e o Dr. José Calheiros. Este dissertou brilhantemente sobre o tema “A Separação”. Todo o auditório ficou verdadeiramente comovido.

Por fim, fez o brinde de honra o Dr. Alfredo Oiticica que num vibrante improviso discorreu sobre o tema “O Homem”. Os aplausos eram extraordinários. Havia desusado entusiasmo! ... À tarde, foi levada à pia batismal, no altar onde se realizou o casamento, a graciosa Maria do Carmo, filhinha do sr. major coronel Manoel Serapião Calheiros, proprietário do engenho S. Francisco, e de sua Exa. esposa d. Rosa Calheiros.

A Liga dos Desmastreados deu a nota, realizando após esse ato interessantes folguedos, alcançando grande êxito. Às 18 horas, mais ou menos, as gentis senhorinhas Julieta Oliveira e Maria de Lourdes Moura organizaram atraentes e lindos brinquedos de salão, havendo por essa ocasião distribuição de prendas, sortes, bombons e coisas interessantes e agradáveis.


Confortável vivenda


Respirava-se um ambiente puro. Os nossos espíritos saltitavam de alegria e satisfação. Seguramente, pelas 21 horas, dava entrada na confortável vivenda uma harmoniosa orquestra composta de vários professores, sob a direção do conhecido maestro Odilon Medeiros. Houve confusão! Muitas vivas e tiveram logo início as danças. Todos animados e contentes se divertiam muito.

Às 24 horas, mais ou menos, por ocasião do chá, a Liga dos Desmastreados incorporada levou a efeito uma significativa manifestação de carinho e apreço ao jovem casal. Em seu nome e no da Liga, usou da palavra, por aclamação de todos, o nosso confrade Agerico Vieira, sendo por várias vezes interrompido por estrepitosas salvas de palmas. Sucederam-lhe os Srs. Pedro Wanderley e José Rodrigues Calheiros, os quais foram muito aplaudidos.

As danças continuaram até pela manhã do dia seguinte. Às 7 horas, houve um original batizado, o que talvez fosse o que mais impressionou aos distintos convivas. Antes do banho, porém, Agerico, Argollo, Santinho, Zé Rodrigues e outros trouxeram todos na mais franca e espontânea hilaridade! Avaliem os leitores! Consumiram whisky, old tom, vermouth, arrematando com duas grandes garrafas de quinado! E àquela hora! Não tendo ninguém ainda pregado os olhos! Foi uma troça excelente. Talvez a melhor do ano. Notava-se o riso. Havia espontaneidade de espírito e de coração!

Pelas 11 horas foi servido farto almoço usando da palavra, ainda por aclamação, o nosso confrade Agerico Vieira. Às 13 horas, seguramente, seguiram todos em trem especial da Great Western para a estação do Nicho, onde os nubentes estão com a sua confortável casa de residência. Aí foi servido profuso jantar regado a finas iguarias.

Várias pessoas, à noite, regressaram para esta cidade no trem do Recife, enquanto outras ficaram [se] divertindo, dominados por inspirados “tangos”, “cateretês”, “valsas”, “one steps” executados com perícia ao piano pelas graciosas Mlles. Alaíde Moreira, Maria de Lourdes e Maria José Moura. As Exas. famílias dos contraentes cumularam de gentilezas a todas as pessoas que compareceram a essa encantadora festa nupcial. O “bar” esteve a contento geral, irrepreensível, sem a menor discrepância, graças à operosa direção dos conhecidos profissionais Manoel Pelágio e João Leonídio dos Santos.

Terminando esta notícia, enviamos os nossos parabéns ao distinto par, desejando-lhe toda sorte de felicidade.


[Matéria transcrita do Jornal do Recife (13/10/1918, pág. 1)]

quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Maceió no tempo em que só havia dois sexos

Gustavo Maia Gomes























Há 120 anos, mais precisamente, em 11/4/1897, o jornal "Orbe" noticiava o aniversário da Sociedade Perseverança e Auxílio dos Caixeiros de Maceió. Alípio Maia Gomes (1878-1916), à época, ainda candidato a estudar medicina, fez um discurso elogiado, mas cujo conteúdo o jornal não resumiu. Copio um parágrafo integrante da matéria relativa à solenidade.

"Novas girândolas fendem o ar. É a banda da simpática Filarmônica Minerva que chega, trazendo luzidio acompanhamento. Todos os salões [da Perseverança e Auxílio] ficam repletos do que a nossa sociedade tem de mais seleto no sexo forte. Veem-se também, no Salão Nobre, algumas Exas. Sras. Era o belo sexo que vinha trazer o seu cativante, gentil e brioso concurso à festa da briosa mocidade".
O "sexo forte" e o "belo sexo". Para o bem ou para o mal, perdemos essas distinções. O “sexo forte” enfraquece a olhos vistos; enquanto o “belo sexo”, gradativamente, cede lugar a um festival de bruxas autodenominadas “feministas”. (Não quero dizer que todas as feministas sejam bruxas, nem que todas as bruxas sejam feministas. Mas, que há uma certa correlação, há.)

Na verdade, já nem se pode falar em sexo (o correto seria “gênero”), muito menos, em apenas dois sexos. Na inesgotável fábrica de minorias estridentes em que se transformou o nosso mundo -- não apenas em Maceió --, abundam os LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais, transgêneros...). E ninguém garante que iremos parar por aí. Afinal, o alfabeto é rico e não será por falta de letras que novas combinações deixarão de ser criadas.

Ah, se Alípio Maia Gomes soubesse disso!

(Na foto, o antigo prédio da Sociedade Perseverança e Auxílio dos Caixeiros de Maceió, localizado na Rua do Sol, que está tombado e preservado. Hoje, é sede do Sindicato dos Empregados no Comércio do Estado de Alagoas. O casarão de estilo eclético e verde marcante faz parte da Zona Especial de Preservação do Centro.)

sábado, 12 de novembro de 2016

Bondade do mal, maldade do bem

O capitalismo — com seus ingredientes necessários: a propriedade privada e a ampla liberdade do indivíduo buscar seu interesse próprio, mesquinho e egoísta — criou as mais ricas sociedades jamais vistas na História da humanidade. Estou falando da Europa ocidental contemporânea, dos Estados Unidos, Canadá, Japão, Austrália...

Além de ricas, também as mais inclusivas, não no sentido de igualdade econômica, mas do acesso de todas as pessoas a níveis de consumo com que seus antepassados jamais poderiam ter sonhado. Pegue um indivíduo classificado, hoje, como pobre na Alemanha, França, Inglaterra... Em 95 por cento dos casos, comparado ao seu tetravô, ele é milionário.

Além de ricas e inclusivas, também as mais abertas politicamente. Um camponês medieval — integrante da classe mais numerosa em lugares como os citados acima — só participava da grande política nas poucas ocasiões em que, passando fome, promovia uma revolta no campo. Nas sociedades capitalistas avançadas de hoje, o tetraneto daquele camponês elege seu governo — ou o destitui.

A despeito disso, o capitalismo está cheio de inimigos barulhentos — não estou falando do Brasil, onde isso é óbvio, mas, sobretudo, da Europa. Seus amigos, em contraste, são poucos, envergonhados, silenciosos. 

Debati, recentemente com um economista francês, chefe de um instituto de planejamento importante em Paris. Ele acha o capitalismo destruidor e a propriedade privada pecaminosa. (Esqueci de dizer que, além de economista francês — o que já bastaria —, ele também é padre.) Aconselhou-nos a imitar os nativos africanos ou os índios brasileiros, que não conhecem a propriedade privada. (E produziram aquelas sociedades de gosto duvidoso.)

Da África ou da selva amazônica para o socialismo, é só um passo. Quem poderia ser contra (assim pensa a boiada, não eu) um mundo oficialmente construído com base no amor ao próximo, na solidariedade? Sem propriedade privada, nem exploração do homem pelo homem... Como o fizeram Stalin, Mao Zedhong, Pol Pot, Fidel, o gordinho sinistro da Coreia do Norte... Um mundo planejado por intenções bondosas que produziram assassinatos em escala industrial, ditaduras ferozes e inclusão de todos (quase todos) na mesma miséria.

Pois eu dou vivas ao capitalismo: prefiro ter a bondade do mal do que a maldade do bem.

(Publicado no Facebook, 12/11/2016)

Xô blô gô

O Recife tem um polo de igrejas evangélicas. Fica nas avenidas Cruz Cabugá e Mário Melo, bairro de Santo Amaro. Ocorreu que precisei caminhar por ali. Fui abordado por uma jovem senhora de aparência indiferenciada que me disse:

— Xô blô gô.

Fiz menção de não ter entendido. Ela repetiu: 

— Xô blô gô. É Deus quem está lhe dizendo.

O que faço com o meu xô blô gô? Não sei. Mas a intimidade da jovem senhora com Deus me impressionou. Disse-lhe:

— Muito obrigado. Dê lembranças.

(Publicado no Facebook, 11/11/2016)

Mais um Dia da Bagunça


Muitos de nós -- alguns com as melhores intenções; outros, nem tanto -- passa boa parte do tempo criminalizando a ação da Polícia. O resultado é que, quando precisamos dela, como hoje (11/11), em face desses atos de sabotagem, não a temos. 

Que policial obedeceria a uma ordem de restabelecer o trânsito (se necessário, à força) numa rodovia ou avenida, diante desse clima de opinião pública que ajudamos a criar? Que comandante de Polícia se arriscaria a cumprir seu dever cívico, ordenando a liberação das vias?

Receio que nenhum. Pois, basta a televisão mostrar as imagens de um único manifestante ferido para que um processo criminal seja aberto contra o comandante e seus subordinados. Com a aprovação de quase todo o mundo. (Não a minha, certamente.)

Em agudo contraste, nunca vi um presidente, governador, prefeito, general, comandante de PM, ou delegado de polícia ser processado por se recusar a garantir o direito do cidadão ir e vir, trabalhar, ou ir à praia sem ser ameaçado por vagabundos.

Minorias violentas que agem sob a proteção de uma opinião pública complacente pavimentam o caminho que leva às ditaduras, seja as de direita, seja as de esquerda ou as do meio. Ou nos livramos dessa mentalidade do coitadinho oficial, ou estaremos, para sempre, perdidos. 

(Publicado no Facebook, 11/11/2016)

segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Velleda Cardozo Barreto (1915-c.2012): Uma baiana "quase" Maia Gomes

Gustavo Maia Gomes



Antonio Pinto e Velleda Cardozo Barreto


Há um aspecto da vida privada de Sérgio Cardozo (1858-1933), ancestral de muitos Maia Gomes baianos, que, aparentemente, era desconhecido por Ronaldo Ribeiro Jacobina, autor de um valioso estudo ("Sérgio Cardozo: Um Conjacuipense Acadêmico de Medicina, Abolicionista e Republicano". Gazeta Médica da Bahia, 2008), no momento em que ele o escreveu. É que, antes de encontrar Elisa Costa, Sérgio teve um primeiro casamento com Maria Odília Couto (?-1914), do qual nasceram quatro filhos, todos com sobrenome Cardozo: Adélia (Barretto por casamento, 1884-?), Alarico (1886-?), Samuel (?-?) e Azurah (Almeida, por casamento, ?-?). Uma das netas de Sérgio e Maria Odília, Velleda Cardozo Barreto (1915-c.2012, depois do casamento, Vellêda Cardozo Barreto Pinto), filha de Adélia, foi militar, professora, poeta e atriz amadora. Voltarei a ela mais adiante.


Maria Odília, primeira mulher de Sérgio Cardozo, deve ter morrido jovem, mas as duas famílias, sucessivamente, constituídas pelo seu marido mantiveram relações amistosas, o que deduzo dos fatos de que: (1) Velleda, no Facebook (terá sido ela, mesma, quem escreveu isso?) se refere a Elisa Costa, a segunda mulher de Sérgio, carinhosamente, como “Mãe Iaiá”; (2) Yara Cardozo Maia (filha de Alípio, neta de Sérgio e Elisa) era afilhada de Adélia Cardozo Barreto (filha de Sérgio e Maria Odília). Todas essas informações foram colhidas na página do Facebook criada em nome de Vellêda, de quem, infelizmente, não consegui obter nenhuma notícia mais recente. Pelas anotações na página do Facebook que traz seu nome, receio que tenha falecido em 2012.[1]

Velleda Cardozo Barreto que, portanto, não tinha parentesco com os Maia Gomes, viveu uma história interessante. Descendente de espanhóis, pelo lado paterno, foi organizadora e a primeira comandante da Polícia Feminina da Bahia, depois absorvida pela Polícia Militar do Estado. Era dada à poesia e, nessa condição, contribuiu para o livro Amor natal e outros temas, publicado em Salvador (1982). Fazia, também, poemas avulsos, alguns dos quais foram reproduzidos em um blog que leva seu nome. Casou-se com o ator Antonio Henriques da Rocha Pinto (conhecido como Antonio Pinto) e os dois fundaram o Teatro de Amadores da Bahia – TAB, sobre o qual encontrei uma informação isolada na página de Vellêda no Facebook, que há quatro anos não é movimentada:[2]

O TAB foi criado em 10 de abril de 1949, tendo como sócios fundadores Antonio Henriques da Rocha Pinto e Vellêda Cardozo Barreto Pinto. Participaram do TAB os seguintes atores: Carlos Petrovich, Sonia dos Humildes, Jurema Penna, Mario Gadelha, Milton Gaucho, Passos Neto. Entre tantos atores maravilhosos, teve em seu elenco Othon Bastos [nascido em 1933] e Geraldo Del Rey [1930-93] [que se tornaram muito conhecidos por integrarem o elenco da Rede Globo de Televisão].[3]

Segundo seu parente “panteísta, por enquanto” Amon Affonso Salvador, bisneto de Sérgio Cardozo e de Maria Odília Couto, Velleda nasceu no dia 21 de agosto de 1915. Ela e Antonio Pinto “não tiveram filhos biológicos, mas adotaram judicialmente Lúcia Lélis Pinto Ribeiro” que se casou com Luiz Jorge Martins Ribeiro. “Velleda e Antonio Henriques”, prossegue Amon Affonso, “tiveram duas netas, Fernanda Pinto Ribeiro e Flavia Pinto Ribeiro, e duas bisnetas, Maria Luiza e Isis.[4]
 O sangue artístico de Velleda deve ter vindo de seus ancestrais espanhóis e não de Sérgio Cardozo. Pois nos descendentes Maia Gomes do grande abolicionista baiano não consegui identificar ninguém que tivesse pendores para o teatro. Uns poucos escritores, mas não poetas, até que sim. Gente capaz de subir num palco, desconheço.





[1] Copio da fonte que localizei no Facebook. É Velleda Cardozo Barreto Pinto (ou alguém, em seu nome) falando: “Sergio Cardozo, nas segundas núpcias, se casou com Elisa Costa (Mãe Iaiá) com quem teve três filhos: Elisette, Elderico (Tio Zoza) e Ivan que morreu pequeno. Elderico casou com Maria José (Menininha). Elisette Cardozo casou com o Dr. Alípio Maia Gomes. [Tiveram] quatro filhos: Luiz Cardozo Maia (nasceu em 4/4/1913), Francisco Cardozo Maia (11/7/1914), Yara Cardozo Maia (7/7/1915) e Inah Cardozo Maia (22/10/1916). [Esta última], afilhada de Adélia, casou-se com Muricy (sic) e teve três filhos: Marília, Sulamita e Sergio. Yara Cardozo Maia casou-se com João Brandão. [Tiveram] cinco filhas: Isa, Elizete Maria, Amazonina, Yara e Auxiliadora. Em Vellêda Cardozo Barretto Pinto, História da Família, publicado em https://www.facebook.com/332552690110925/ photos/a.332585546774306.86141.332552690110925/334552643244263/?type=3 (24/1/2012, acesso em 7/11/2016). Consegui contato, já no processo de escrever o presente capítulo, via telefone ou Facebook, com as irmãs Isa e Amazonina, além de Marília Muricy, prima das duas.

[2] Vários autores, Amor natal e outros temas. Bahia: Empresa Gráfica da Bahia. 1982.



[4] Fonte: http://amonaffonso.blogspot.com.br/2010/02/minha-famila-por-parte-de-avo-materno.html. O blog de Amon Affonso só tem postagens até 2010. (Não dá pra saber, portanto, se ele ainda continua panteísta.)