sábado, 27 de janeiro de 2018

Badu: Louco ou chantagista?

 Gustavo Maia Gomes


Osvaldo Moreno, Badu, se apresentava, entre 
outros disfarces, como Osvaldo Bahia. Esta foto foi 
publicada nos jornais do Rio de Janeiro em abril
de 1955, depois de descoberto seu golpe 
mais audacioso: ser recebido como deputado
estadual de Alagoas (coisa que ele nunca seria) 
na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.




Osvaldo Bahia nunca existiu. Enganou a todos até nisso. Sem jamais ter existido, viveu a eletrizante, atribulada história que passo a contar. Foi o maior vigarista brasileiro em seu tempo, os anos quarenta e cinquenta do século 20. Em um de seus muitos disfarces, assumia-se irmão de minha avó Josefa, tio de meu pai Mauro, tio-avô deste que vos fala. Mas, Osvaldo Bahia nunca existiu. Badu, sim.

No Ceará

Em 17 de outubro de 1947, um jornal do Rio de Janeiro, publicou a seguinte notícia:
Louco ou chantagista. Fortaleza, 17. A Polícia cearense acaba de prender um indivíduo procedente de Alagoas. Trata-se de Osvaldo Brandão, do qual não se sabe ainda se é louco ou chantagista, pois veio dizendo ser deputado alagoano, transferido para a Assembleia cearense, e que o governador Silvestre Péricles [de Alagoas] trucidara toda a sua família.[i]
“Aqui chegado”, continua, “iludiu uma família de agricultores, dizendo que viera cumprir uma missão de Deus, fazendo sessões espíritas nas quais apareciam almas de urubus que aconselhavam a filha do agricultor a se casar com o enviado”. O casamento realizou-se, mas, um dia, sentindo o espertalhão que a polícia estava em seu encalço, “vestiu-se de luto e declarou que precisava regressar a Alagoas, por ordem dos anjos”.
Debalde. Foi preso. E iludiu a polícia. Seu nome do homem não era Osvaldo Brandão, nem Osvaldo Bahia, nem Aluísio Brandão Bahia, nem Carlos Brandão Bahia, nem Osvaldo Soares Malta, nem Osvaldo Soares Bahia, nem Osvaldo Brandão Vilela Bahia, nem Manuel Vilela, nem Antônio dos Santos, nem Osvaldo Moreira, nem Antônio Malta, nem Carlos Vilela, nem “Malta”, nem “Rocha”, nem José Malta, nem Mário Bahia...
Nos doze anos de sua vida ativa que pude acompanhar pelos jornais, o “louco ou chantagista” vindo de Maceió usaria todos esses nomes para se apresentar nos muitos lugares por onde andou – Fortaleza, Crato, Recife, São Paulo, Santos, Santo André, Presidente Prudente, Rio de Janeiro, Niterói, Campinas, Belém – quase sempre dando golpes em gente de destaque. Quando, supostamente, morreu, assassinado na capital paraense, o jornal A Noite chamou-o “Rei dos Malandros”.
Digo “supostamente” porque não estou certo de que Osvaldo Moreno (seu verdadeiro nome, que ele nunca usava; Badu era o apelido de criança) morreu mesmo naquele dia, ou se apenas inventou a história para, pela centésima vez, despistar os perseguidores e continuar a vida escondido sob novos nomes, que ninguém mais conseguiu descobrir. É estranho, por exemplo, que só um jornal tenha noticiado o “fato”, mesmo assim, sem destaque, no meio de uma matéria que tratava de outro marginal, o “Príncipe dos Malandros”.
Em fevereiro de 1948, cinco meses depois do infortúnio cearense, portanto, o “louco ou chantagista” declarou ao Diário de Pernambuco (desta vez, estava preso no Recife) ter 17 anos de idade. (Teria, portanto, nascido em 1930 ou 1931.) Acho que mentiu. Quando, em 1955, Osvaldo teve a fotografia publicada nos jornais do Rio de Janeiro, após consumar sua obra prima, ludibriando de uma só vez todos os deputados estaduais, tinha a aparência de um homem de 35 anos, não de 24. Posso estar enganado. Sua vida atribulada o teria feito parecer mais velho do que, realmente, era. Em seu favor, há o fato de que ele sempre informou à polícia idades que, em cada momento, eram compatíveis com a declarada em 1948. Talvez esse tenha sido o único aspecto de sua biografia sobre o qual não inventou mil versões diferentes.
Embora notável pela sua audácia, Osvaldo Moreno era, frequentemente, capturado pelas polícias dos estados por onde andou. Nesse sentido, não teve sucesso inquestionável. Foi graças às repetidas passagens por delegacias que consegui seguir suas pegadas, noticiadas nos jornais da época. Será que ele planejou isso para, então, ganhar a notoriedade que se achou incapaz de atingir trilhando caminhos menos convencionais?
É só uma pergunta.

Como o descobri

Desde a infância, eu tinha algumas informações esparsas sobre um “parente” de meu pai que passara a vida dando golpes. Ele falava nisso e sempre lembrava que a façanha mais vistosa do vigarista fora ser recebido solenemente como deputado alagoano na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. (Coisa que, claro, ele não era, não tinha sido, nem viria a ser.) Fiz a referência em O Trem para Branquinha, meu livro sobre a história da família que deve ser lançado em abril deste ano. Sucinta, naturalmente. Do único modo que a minha ignorância de então permitia.
Ocorre que, à época em que ouvi essas histórias, faltava-me capacidade de atribuir-lhes um contexto. (Afinal, o esperto dizia ser filho de quem, neto de quem mais? Como ele se relacionava, genealogicamente falando, comigo e com meu pai?) De modo que elas me ficaram gravadas na mente apenas como anedotas. Nem eu, nem meu irmão Ivan, conseguíamos recordar, sequer, o nome do malandro. Com tão poucos dados iniciais, seria impossível fazer uma busca sistemática de informações sobre ele.
Para minha sorte, fui ajudado por uma frase recente de Vania Maia Gomes Lages, filha de Helena, neta de Francisco da Costa Bahia e de Alice Soares Bahia. (Guardem esses nomes. Eu sou bisneto de Francisco, mas não de Alice; minha bisavó chamava-se Ernestina, primeira mulher de Francisco.) Vania me disse que um menino pobre havia sido acolhido por Alice, então já viúva. (Seu marido morrera em 1921.) Esse garoto viveu por um tempo na casa dela, em Viçosa, Alagoas. Passou, depois, a se apresentar como Osvaldo Bahia, mas não era, de fato, um membro da família.
Muito cedo, começou a revelar o que viria a ser quando adulto. Pode ter saído da casa por vontade própria ou expulso, mas o fato é que, durante um tempo, ele conviveu com uma família importante, na então rica e progressista cidade alagoana. Ouviu as conversas da casa, fez perguntas, recolheu informações que, mais tarde, lhe seriam úteis para compor suas falsas (porém, para mentes receptivas, verossímeis) histórias, onde ele sempre se apresentava como amigo ou parente das maiores figuras de Alagoas. Mais do que isso, levado pelos Bahia, Osvaldo Moreno teve acesso aos altos círculos políticos e intelectuais da Viçosa da primeira metade do século XX. E isso não era pouca coisa:
Em terras viçosenses nasceram o menestrel Teotônio Vilela [que se tornou nacionalmente célebre pela campanha contra o regime militar de 1964-85] e seu irmão cardeal primaz do Brasil Dom Avelar [Brandão Vilela, a quem encontraremos logo abaixo]. [Em Viçosa,] Graciliano Ramos [Vidas Secas, Memórias do Cárcere...] viveu e inspirou-se o para escrever São Bernardo. É de Viçosa o primeiro tradutor brasileiro do Manifesto Comunista, o militante Otávio Brandão. Viçosa criou poetas da estirpe de Manoel Neném e Zé do Cavaquinho, criou também a escola folclórica conhecida em todo o Brasil com Théo Brandão [marido de Élide Bahia, neta de Francisco e Alice], José Aloísio Vilela [casado com Laura, filha de Francisco e Alice], José Pimentel e José Maria de Melo. Em Viçosa, na Serra Dois Irmãos, tombou o líder guerreiro Zumbi dos Palmares.[ii]
A partir dessas pistas iniciais, montei minha busca pelo personagem misterioso, o parente que não era parente. O resto da resposta à pergunta sobre quem foi e como descobri “Osvaldo Bahia” tem tudo a ver com os maravilhosos milagres tecnológicos de nossa era. Um marco da investigação foi o seguinte: procurando referências a Francisco da Costa Bahia nos jornais antigos coletados e digitalizados pela Biblioteca Nacional (do Rio de Janeiro; eu trabalho no Alto do Céu, Recife!), deparei-me com uma extensa matéria do Diário de Pernambuco (17/2/1948) relatando o caso do “tuberculoso detido há 64 dias na Delegacia de Investigações e Capturas”.
Tratava-se de um certo “Osvaldo Brandão Vilela Bahia”, segundo ele próprio, “natural de Alagoas, filho de Francisco da Costa Bahia e Alice Brandão Vilela Bahia”. O homem contou uma longa história, relatada na seção seguinte. Enganou o repórter policial do Diário, que acreditou em cada palavra dele. Iria se arrepender poucos dias depois. É que o duplo nome “Brandão Vilela” não passou despercebido a um leitor especial: o então bispo de Petrolina e futuro cardeal primaz do Brasil.
Dom Avelar Brandão Vilela, como vimos, era da mesma cidade de Alagoas onde os Bahia moravam há décadas. Mais do que isso, as famílias Brandão Vilela e Bahia se haviam entrelaçado pelos casamentos de José com Laura e de Theo com Élide. O bispo escreveu para o jornal dizendo saber quem era aquele jovem. Denunciou a farsa, contou histórias de golpes dados pelo meliante, e deu outros nomes já anteriormente usados pelo falso Osvaldo Brandão Vilela Bahia, na verdade, Osvaldo Moreno.
Conhecendo esses nomes e os demais que foram aparecendo nas notícias sobre o vigarista, fui ampliando minha busca na coleção de jornais antigos. O que consegui reunir é de estarrecer, mas, também, de provocar risadas. Osvaldo Moreno foi um gênio. Se tivesse usado seus talentos para fins socialmente úteis, poderia ter-se tornado não o “Rei dos Malandros”, mas um político de destaque, um romancista dos bons, um jornalista demolidor. Candidato sério a orgulho da família, mesmo não sendo ele um autêntico Bahia. Em verdade, no seu íntimo, suponho eu, o menino criado por Dona Alice nem desejou essas glórias, cujo desfrute jamais se compararia à felicidade que sentia ao fazer um otário acreditar em suas histórias alucinantes. E ainda pagar por isso.

Em Pernambuco

O mais antigo registro do nome Osvaldo Bahia que encontrei nos jornais é de 1945. Pelas suas contas, ele teria, então, 14 anos. Estava no Recife. É uma notícia com poucos detalhes; não dá para saber se é a mesma pessoa. (Afinal, Osvaldo Bahia não era um nome assim tão raro.) Transcrevo:
Furto de Cr$ 50,00 e de uma aliança de ouro. Branca Cacilda Amorim de Oliveira, com domicílio à Rua de Santa Tereza n. 93, bairro de São José [Recife], à tarde de ontem, procurou a polícia para queixar-se contra Osvaldo Bahia. Afirmou que este penetrou em seu domicílio, furtando a importância de Cr$ 50,00 e uma aliança de ouro com a inscrição interna “Antônio”.[iii]
Podia ou não ser ele, mas o estilo é parecido, como veremos. Teria Osvaldo Moreno fugido de Alagoas e vindo para Pernambuco, somente em seguida se passando para o Ceará? Talvez. Uma das lições que aprendi seguindo as pistas do falso parente foi que, no seu ramo de negócios, mobilidade é fundamental.
A notícia seguinte é aquela do “louco ou chantagista”. Mas, o tempo não para, nem as peripécias do falso Bahia iriam terminar tão cedo. Em 17 de fevereiro de 1948 (curiosa essa fixação com o dia 17; é a terceira vez que ele aparece), o Diário de Pernambuco estampou a longa matéria “Tuberculoso detido há 64 dias na D.I.C. [Delegacia de Investigações e Capturas]” Transcrevo partes dela:
A história de Osvaldo Brandão Vilela Bahia, menor de 17 anos, é bem triste, conforme o repórter policial do Diário teve ocasião de saber. (...) Natural de Alagoas, filho de Francisco da Costa Bahia e Alice Brandão Vilela Bahia, fugiu de casa, no interior daquele Estado, há cerca de dois anos, depois de uma série de irregularidades que cometeu. Levou no bolso Cr$ 6.000,00 [equivalentes a 16 salários mínimos da época], produto da venda de seis novilhas “surrupiadas” ao próprio pai e adquiridas por um amigo deste, graças à falcatrua que Osvaldo planejou e levou a bom termo para negociar as “crias”.[iv]
A reportagem prossegue informando que, em seguida, Osvaldo foi para Fortaleza, no Estado do Ceará, e dali rumou a um dos municípios próximos, “onde se empregou no barracão da propriedade do maior comerciante de cera de carnaúba conhecido pelas redondezas. Depois de namorar uma das filhas de seu patrão, seduziu-a e terminou casando com a mesma, a despeito da oposição do pai”. Continua a matéria, sempre baseada nas informações fornecidas pelo falso Osvaldo Brandão Vilela Bahia:
Finalmente, graças ao mau caminho tomado pela sogra de Osvaldo, que se deixou seduzir por um tenente da Polícia do Ceará, Osvaldo fugiu deste Estado e levou consigo enorme comitiva: a esposa, a sogra, o namorado desta, que então dera “baixa”, dois cunhados e uma cunhada, num total de sete pessoas, ele, inclusive.
O repórter não considerou estranho que o namoro clandestino da sogra de Osvaldo com um tenente da polícia provocasse tamanha debandada de cearenses, estranhamente comandados por um menino alagoano de 17 anos que não tinha mais no bolso sequer um tostão dos que havia furtado do pai (tudo, segundo sua própria história). Mas, como “furtado do pai”? Francisco da Costa Bahia já estava morto há 26 anos, quando esses eventos, alegadamente, ocorreram! O relato prossegue:
Em menos tempo do que se esperava, Osvaldo Brandão & Cia. deram fim aos Cr$ 50.000,00 [130 salários mínimos da época!] que sua sogra levou, em dinheiro, produto de suas economias. A esse tempo, estavam todos no interior de Pernambuco, e sem tostão, quando Osvaldo planejou, para ganhar dinheiro, “estabelecer-se” com um negócio de baixo espiritismo e enganou muita gente, até o ponto de pessoas e autoridades deixarem-se enganar pelo rapaz na questão de saber dos dois candidatos em luta qual seria o [próximo] governador do Estado.
O negócio ia bem, sugere o Diário, mas deve ter suscitado inveja, pois, um dia, a polícia chegou:
Fartos de todos os truques de Osvaldo Brandão Vilela, decidiram prendê-lo sob acusação de “scroqueria” (sic), professador de falsas doutrinas e outros pretextos arranjados para cassar-lhe os meios fáceis de vida a que se entregara, para sustentar seis pessoas com ele, pois, a esta altura, o ex-tenente abandonara a amante.
Prenderam-no e soltaram-no quatro vezes seguidas e, até a ida do sr. Alarico Bezerra para a Secretaria de Segurança, Osvaldo passou alguns dias em paz. Uma vez, porém, que assumiu o poder o “senhor de engenho”, Osvaldo Brandão não teve mais sossego. (...) Da sala de permanência (banco dos detidos) às várias dependências do xadrez da Secretaria [está sempre] mal alimentado, passando, às vezes, fome e dormindo mal, no chão úmido de água atirada propositadamente.

As consequências

Boa coisa não sairia daquilo tudo.
Osvaldo contraiu forte resfriado. A moléstia foi minando-lhe o organismo e, de algumas semanas para cá, deu para ter crises horríveis, ao fim das quais lhe aparecem ataques de hemorragia, deitando muito sangue. Há 64 dias detido na sala de permanência do D. I. C., sem que seu caso se resolva, e onde já esteve à disposição da polícia de Alagoas, Osvaldo Brandão Bahia foi presa de várias crises de sangue. Afinal, na última quinta-feira, chamado o médico para examiná-lo, deu-o como tuberculoso.
Desconfio que o falso Bahia enganou não apenas o médico como o repórter, pois nenhuma outra notícia de tuberculose jamais apareceu nas passagens posteriores dele em tantas cidades. Não importa. Usando o Diário, ele conseguiu tornar pública sua história. Aproveitou para dizer que “a sogra, os dois cunhados e uma cunhada se encontram passando privações na Seção de Repressão à Mendicância e Vadiagem, na rua Visconde de Goiana [Recife]”. Nesse ponto, o jornalista, decididamente, comprou sua história e se revoltou por ele:
O rapaz não tem crime algum, nenhuma culpa formada contra ele e, tão pouco, está sujeito a quaisquer averiguações policiais. Não obstante isso, permanece naquele departamento de polícia, o que é um crime, pois sua presença ali é um foco de contágio para outros detidos.
Que o soltassem, portanto, pois, quando deu a entrevista, “o rapaz [estava] já com as faces macilentas e tossindo muito”. Dando voz ativa ao entrevistado, o repórter transcreveu suas palavras: “Osvaldo Brandão Vilela Bahia, detido há 64 dias na permanência da D. I. C., não se encontra à disposição de ninguém, exceto da tuberculose”. Brilhante, sem dúvida, a figura que o meliante criou: “não estou à disposição de ninguém [nem mesmo da polícia de Alagoas]; apenas, da tuberculose”. Deu certo. No dia seguinte, o mesmo Diário de Pernambuco dava a notícia:
Afinal, resolvida a situação do tuberculoso e sua família. À noite de ontem, Osvaldo Brandão Vilela Bahia procurou-nos para agradecer-nos a caridade que lhe tínhamos feito. [Ele fora libertado.] (...) Desse modo, com as pessoas por quem, espontaneamente, se responsabilizou durante tanto tempo, aquele pobre rapaz detido de maneira injusta e criminosa viajará para Fortaleza, onde seu sogro já tomou todas as providências.[v]
Tudo indica que ele nem “recolheu a família” e nem voltou para Fortaleza coisíssima nenhuma. Sua próxima aparição em jornais, das que consegui recuperar, é de maio de 1950 e já o dava como instalado há meses em São Paulo, onde foi preso, devido aos golpes que aplicara na cidade. Uma das notícias então veiculadas relata pedido de informações da polícia de São Paulo à de Alagoas, a respeito dos antecedentes de Osvaldo Moreno. E a resposta vinda de Maceió dizia que ele voltara do Recife para Maceió (não para alguma cidade do Ceará, portanto), fizera suas traquinagens por lá, fora pego e internado em dois hospitais de alienados, de um dos quais havia saído “há pouco tempo”.
Ainda não terminei, porém, com o caso do “tuberculoso injustamente detido no Recife”. Novos elementos sobre “Osvaldo Brandão Vilela Bahia” seriam acrescentados, apenas três dias depois da primeira notícia (ou seja, em 21/2/1948), pelo então bispo de Petrolina (PE), Avelar Brandão Vilela, em carta ao Diário de Pernambuco.

O bispo conhecia Osvaldo

Dom Avelar sempre teve fama de moderado, discreto. Numa fase posterior da vida, já feito cardeal da Igreja Católica, enquanto seu irmão e senador Teotônio estava todo dia nos jornais, protestando contra o regime militar, ele se manteve em silêncio. Foi criticado por sua neutralidade política, numa época de intensa mobilização. Em 1948, entretanto, nada disso havia, ainda, acontecido. Uma certa manhã, imagino eu, o bispo de Petrolina pegou os jornais do Recife para ler e se deparou com a reportagem sobre o pretenso Osvaldo Brandão Vilela Bahia. Transtornado, escreveu uma longa carta ao repórter policial do Diário de Pernambuco. Logo após a introdução necessária (“acabo de ler a reportagem que v. s. apresentou ao público pernambucano, relativamente a um rapaz etc.”), foi ao assunto:
Lendo sua reportagem, senti a necessidade de fornecer-lhe algumas indispensáveis informações acerca desse jovem [o pretenso Osvaldo Brandão Vilela Bahia] cuja situação física e moral profundamente lamentamos.
Estava eu na cidade de Alagoa Grande (Paraíba), [em] dezembro de 1947, quando o vigário geral da Diocese [de Petrolina, suponho, GMG], mons. Angelo Sampaio, recebeu do Crato [Osvaldo no Crato!], do sr. bispo diocesano, um telegrama dizendo-lhe que pessoas de minha família aguardavam instruções para seguirem viagem a Petrolina. Tudo ignorando, mons. Angelo respondeu que o bispo diocesano [ele, Avelar] estava ausente e nada podia acrescentar.[vi]
No dia seguinte, prossegue Avelar Brandão Vilela, “novo telegrama surge, afirmando que as ditas pessoas viajaram misteriosamente, ficando provado serem trapaceiros”. Então,
Voltando à Diocese [de Petrolina], tive conhecimento do fato. Nova saída tive de fazer, na direção de Salgueiro [PE]. Ao retornar à sede episcopal, aguardavam-me dois telegramas procedentes do Ceará, um do sr. Arcebispo de Fortaleza e outro de um padre do interior, apresentando-me pêsames. Fiquei sem entender o motivo das condolências, pois ninguém da minha família falecera, naqueles dias.
Algum tempo depois, recebi de Recife, assinado por frei Manoel, do Convento do Carmo, um telegrama dizendo-me que Manoel Vilela, inculcando-se meu irmão, estivera com ele, afirmando trazer minha mãe a Petrolina, com mil dificuldades, uma vez que, em Alagoas, por questões políticas, morreram assassinados por adversários meu pai e meu irmão.
Diante disso, pedia auxílio para a longa viagem empreendida. No dia seguinte, do juiz de Menores, dr. Rodolfo Aureliano, recebi telegrama perguntando-me se possuía um irmão de nome Osvaldo Brandão Vilela que conduzia minha mãe a Petrolina.
Só então Dom Avelar compreendeu o enredo da história, o motivo das mensagens de pêsames provenientes do Ceará. Enviou um telegrama para a família dele “que, realmente, reside em Alagoas” comunicando o fato e perguntando se os parentes podiam informar algo sobre o assunto. Volto a citar literalmente a carta:
A resposta da casa situou bem a questão. Tratava-se de um moço – Osvaldo Moreno – criado, desde pequeno, pela viúva d. Alice Bahia, moço que, desde cedo, revelou tendências pronunciadas para o furto e dezenas de semelhantes habilidades. Fugira da residência de d. Alice, senhora pertencente a uma das famílias mais destacadas de Assembleia [ou seja, Viçosa, explico em seguida, GMG] e entregara-se, de corpo e alma, a toda espécie de falcatruas.
“Vila de Assembleia” foi um dos primeiros nomes de Viçosa (AL). Entre 1943 e 1949, a cidade retomou a denominação de Assembleia. Como explica a Wikipedia, em 1943, Getúlio Vargas proibiu que se usasse o mesmo nome para mais de uma cidades. “Como no estado de Minas Gerais já havia Viçosa, com o nome mais antigo, a Viçosa de Alagoas voltou a se chamar Assembleia. Em 17 de setembro de 1949, [entretanto], após várias reivindicações, o então município de Assembleia [recuperaria o nome] Viçosa”.
Novamente, o relato de dom Avelar Brandão Vilela:
Depois de preso pela polícia, solto, [Osvaldo Moreno] continuou a mesma história, em Alagoas, até que penetrou em outros Estados (Ceará e Pernambuco) com as mesmas tendências e defeitos, acrescentando a todos eles, mais um: a exploração de meu nome e de minha família. Dizendo-se meu irmão, por onde passava, certamente, com o fim de arranjar dinheiro com mais facilidade, contando esse imaginário episódio de mortes e quejandas invencionices, além de outras já divulgadas pela imprensa, o pobre do Osvaldo estava a merecer de minha parte uma denúncia ao sr. Secretário de Segurança.
As denúncias – mais de uma, sim – foram feitas e repetidas. Telegramas foram enviados ao secretário de Segurança, Alarico Bezerra, mas tiveram pouco efeito, reclama Avelar Brandão. E continua:
Além do mais, esse Osvaldo não podia usar o nome de minha família – Brandão Vilela – porque nenhum parentesco tem conosco. Apenas, fora criado na casa de d. Alice Bahia, cuja filha se casara com o meu irmão mais velho. E só.
De modo que, adverte o bispo de Petrolina ao repórter policial do Diário, que se mostrara tão simpático ao “injustiçado” rapaz detido há 64 dias na Delegacia de Investigações e Capturas,
Apesar de [ele, dom Avelar] não ter sido tão bem tratado pelo sr. Alarico Bezerra [que lhe ignorara os telegramas, nada fazendo a respeito das queixas ali formuladas], devo dizer-lhe [ao repórter] que [o secretário] tinha razões sobejas para prender o rapaz.
Mas, àquela altura, Osvaldo Moreno estava, apenas, iniciando a carreira de vigarista. Novos episódios eletrizantes (que lhe levaram a uma internação forçada em manicômio, embora os detalhes disso me sejam desconhecidos) seriam por ele protagonizados no ano seguinte (1949) em Alagoas e, em 1950, em São Paulo.

“Alagoano das Arábias”

Liberado pela polícia pernambucana, Osvaldo Moreno retornou a Alagoas. Certamente, não tinha razões para voltar a Fortaleza, em companhia da sogra infiel, e se sujeitar à ira do velho cornudo. (Admitindo que aquela história não fosse toda falsa, que houvesse, sim, no início dos tempos, um chifre bem colocado por um tenente e uma menina bem comida por ele, Osvaldo.) A notícia seguinte que localizei (17/5/1950 – mais uma vez, o 17!) tem origem em São Paulo e traz o título “Pedida a prisão preventiva do estelionatário Osvaldo Soares Bahia”. O texto não deixa dúvidas de que se tratava do mesmo Osvaldo Moreno que agora assumia o sobrenome “Soares Bahia”, igual ao de Alice, sua alegada mãe, que não era Brandão Vilela coisa nenhuma.
Concluiu a Delegacia de Vigilância e Capturas o inquérito que instalou sobre as atividades do estelionatário Osvaldo Soares Bahia, que usa ainda os nomes de Aluízio Brandão Bahia, Carlos Brandão, Osvaldo Moreira e Antônio dos Santos. Refinado malandro, senhor de habilidade e audácia espantosas, faz pouco tempo, Osvaldo Soares Bahia rumou de Maceió, onde nasceu, para esta capital [São Paulo], aqui se apresentando como “político influente e vítima da perseguição do governo alagoano”.[vii]
A matéria continua afirmando que o estelionatário, em curto espaço de tempo, conseguiu granjear simpatia e confiança de autoridades administrativas e eclesiásticas de São Paulo, “formando ambiente propício à execução de seus ‘golpes’ habituais”.
Dizia-se prefeito de Maceió e usava o nome do chefe do Executivo municipal da capital alagoana, sr. Aluízio Brandão Bahia. [Também se dizia] candidato ao governo no mencionado Estado por uma coligação de partidos da oposição atual. Osvaldo Soares Bahia ainda se apresentava como irmão do bispo de Petrolina e como tal aqui procurou vários dignatários da Igreja, prejudicando-os, também, com os expedientes escusos a que se dá.
Com sua conversa envolvente, o alagoano conseguiu tirar dinheiro do vigário da igreja da Consolação e de um monge beneditino. Ao ser preso, estava na companhia “de uma menor de quem se tornara namorado e com quem fugira. Desta última vítima, Osvaldo Soares Bahia furtou 2.300 cruzeiros, que pertenciam à tia da jovem”.
O alagoano foi detido e, logo depois, solto, mas processado judicialmente. Outra notícia, da mesma época, também vinda de São Paulo e publicada no Diário de Pernambuco já se referia ao vigarista como “Osvaldo Moreira”, mais um disfarce vestido por ele para despistar a polícia. Os mesmos crimes são, novamente, relacionados, com a adição de um detalhe: Osvaldo dizia-se possuidor de grande fortuna em Alagoas. Além disso,
Passou procuração ao advogado José Cândido de Oliveira Costa, ao qual autorizou a retirar do Banco do Brasil, no Rio [de Janeiro], a quantia de 350 mil cruzeiros, que não possuía. Enquanto o advogado viajava para o Rio, em busca desse dinheiro, a Polícia, atendendo a uma denúncia, prendeu Osvaldo em Santos [agora ele estava em Santos! Mobilidade é tudo], onde se encontrava em companhia de uma menor. Depois de prestar declarações em cartório, Osvaldo foi posto em liberdade. Foi instaurado inquérito, tendo sido pedida a prisão preventiva de Osvaldo.[viii]
Dois dias depois, apareciam “novos detalhes sobre as proezas do jovem estelionatário alagoano”. Agora, além de Aluísio Brandão Bahia, Osvaldo Soares Bahia, e Osvaldo Moreira, os investigadores descobriram que ele também assumira o nome de Carlos Brandão Bahia. Mas, a polícia paulista foi esperta: buscou informações sobre o homem no seu Estado de origem. Em resposta, veio o informe de Alfredo Monteiro Quintela, secretário do Interior e Educação do Estado de Alagoas.
Conforme comunicado desse Secretário de Estado, (...) o verdadeiro nome do malandro é Osvaldo Moreno, filho de Jinas [Jonas?] Moreno e Olímpia da Silva Moreno. (...) [Ele], até há pouco, estivera internado em dois hospitais de alienados, em Alagoas. Do último, obteve alta faz poucos meses, dedicando-se, desde então, a expedientes escusos, alcançando sempre êxito graças à sua astúcia e à educação fina que lhe deram seus pais. Sabe-se, por último, que elementos do governo alagoano foram lesados por Osvaldo Moreno, circunstância que o obrigou a deixar Maceió, rumando para São Paulo.[ix]
De todo modo, essa estadia em Maceió, entre 1948 e 1950, parece ter impulsionado a carreira do vigarista. Nessa ocasião, pela primeira vez, ele aparece dando golpes em autoridades (“elementos do governo alagoano”). Antes, seus alvos mais ilustres tinham sido figuras da igreja, conforme o relato de Dom Avelar Brandão. A atuação subsequente dele em São Paulo – inclusive a de 1950, mas, sobretudo, a dos anos 1953-55 – iria se dar, cada vez mais, nos meios políticos.
Volto à ordem cronológica. Como resultado dos seus crimes em 1950, Osvaldo Moreno foi condenado pela Justiça de São Paulo. Ficou preso durante três anos e dois meses e, ao ser preso novamente, em dezembro de 1953, estava em liberdade condicional.[x]
Na edição de 5/12/1953, o Diário da Noite (do Rio) publicou esta notícia, vinda de São Paulo. Ela dá uma ideia geral do que a polícia paulista já sabia sobre o vigarista, até aquele momento. Não era muito.
Há cerca de quatro anos apareceu em São Paulo um alagoano de nome Osvaldo Soares Bahia ou José Malta [mais um nome falso]. Indivíduo bem falante e inteligente, deu para se imiscuir em assuntos políticos, dizendo-se prefeito de Maceió, perseguido pelos políticos de que fugira. E mais: que é sobrinho (sic) do bispo de Petrolina. Com tais “credenciais” o espertalhão começou a viver no meio de pessoas de alta categoria, às quais ia tomando dinheiro “emprestado”.
Certo dia, Osvaldo deu um pulo mais alto e ludibriou um frade, de quem conseguiu apanhar 50 mil cruzeiros. Mas o golpe foi pressentido e a vítima deu parte à polícia, sendo o “vigarista” preso e condenado a três meses de prisão, de onde saiu há pouco tempo. [xi]
Outro golpe foi relatado na mesma matéria: “Osvaldo seguiu para Santo André [SP]. Ali se passava por presidente da Câmara de Viçosa, em Alagoas, e inventou as histórias mais interessantes para agir. Dizia-se vítima dos políticos e assim conseguiu enganar outros, até que foi novamente parar na polícia, que o está processando.”
Nem tudo isso junto, entretanto, fazia jus ao trabalho do alagoano em terras paulistas. Ou a polícia ainda não sabia da missa um terço, ou a obra continuava a ser produzida e, cada vez mais, aperfeiçoada. Em meados de 1954, o jornal A Noite (mais uma vez, do Rio. O que fazia a imprensa de São Paulo, nesse tempo?) produziu uma síntese do que já se conhecia, até então, das peripécias de Osvaldo Moreno. O título da matéria, bem significativo, foi “Alagoano das Arábias...”.
São Paulo (Da sucursal de A Noite). Singular história de um chantagista e paranoico foi dada a conhecer ontem, na Delegacia de Falsificações, onde se achava detido um alagoano sobre cuja identidade, apesar de seus múltiplos nomes, paira certa dúvida. Trata-se de Osvaldo Soares Bahia, ou Osvaldo Moreira, Carlos Brandão, Carlos Vilela, Aluízio Brandão Bahia ou ainda outros batismos.
Egresso da Penitenciária do Estado [SP], onde cumpriu pena de três anos e dois meses por crime de estelionato, é liberado condicional. Sua prisão ocorreu ontem [mais uma: lembremo-nos de que, em São Paulo, ele já fora detido em 1950 e em dezembro de 1953; no segundo caso, após ter deixado a Penitenciária em liberdade condicional], face à denúncia de estar usando, indevidamente, [os] nomes de inúmeros parlamentares, entre os quais o do deputado federal Aliomar Baleeiro, com objetivos de locupletar-se.
Assim prosseguia a reportagem: “Singular criminoso. A vida pregressa do alagoano, atualmente com 23 anos, casado domingo último (era viúvo), é amplamente conhecida em Alagoas”. (Note-se a coerência de Osvaldo quanto a esse ponto: estar com 23 anos em 1954 implicava em ter ele nascido em 1931, como havia dito ao Diário de Pernambuco, seis anos antes. Mas, e a mulher cearense? Havia morrido? Muito pouco provável.) Ainda com a palavra o jornalista de São Paulo:
Esses fatos foram conhecidos das autoridades bandeirantes quando ele aqui delinquiu, sendo condenado por estelionato. Ludibriou várias pessoas, intitulando-se “prefeito de Maceió” e perseguido político do Sr. Silvestre [Péricles] de Gois Monteiro. Narrava, então, sua odisseia, na qual pormenorizava o assassinato dos pais e irmãos. Quando foi preso por tais artifícios, tinha lesado [os dois religiosos já mencionados e a namorada]. Recolhido ao presídio para cumprir a pena que lhe foi imposta, tudo parecia terminado.[xii]
Não estava. Outros desdobramentos da atividade de Osvaldo Moreno em São Paulo ainda iriam ocorrer ou ser conhecidos. E lhe faltava, claro, culminar a carreira com o episódio inigualável da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. No caso específico descrito pela reportagem ora sendo resumida, entretanto, dos trabalhos policiais desenvolvidos resultaram, “além da prisão do indicado, a apreensão, no município de Presidente Prudente, na residência de um cidadão de nome Jacinto Ferreira, de duas cartas rascunhadas, as quais figuravam ser destinadas ao deputado udenista Aliomar Baleeiro”.
O repórter esclarecia, em seu texto, que Jacinto Ferreira, de boa-fé, hospedara o vigarista, “certo de que estava sendo o anfitrião de um personagem de escol” (sic). Ou seja, o falso Bahia, alagoano de Viçosa, tinha passado, também, em Presidente Prudente, uma então pequena cidade do interior de São Paulo, distante 560 km da capital. As cartas, naturalmente, eram obra de Osvaldo Moreno, embora ele tenha negado isso à polícia, e deveriam servir para impressionar o ingênuo Jacinto Ferreira, de quem o alagoano, certamente, esperava conseguir tirar algum dinheiro.
Quanto às cartas, assinadas por “Antonio Malta”, nome pelo qual deveria o chantagista ser ali conhecido, mencionava ele ao pseudo destinatário: “do amigo e cunhado”. O teor da missiva referia-se a uma reunião, questões de dinheiro, entremeada de pedido de remessa de gado, partida de açúcar de sua usina em Alagoas e outras “farolagens”. [xiii]

“Enganou até o governador Adhemar de Barros”

Interventor federal em São Paulo (1938-41), governador do Estado (1947-51; voltaria a sê-lo em 1963-66), prefeito da capital (1957-61), Adhemar de Barros poderia ser tudo, menos ingênuo. Tampouco, parece ter sido o mais honesto dos políticos. A ele é atribuída a frase “rouba, mas faz”; sobre ele, corria a anedota de que ao bradar, durante comício na Praça da Sé, que “neste bolso [batendo com força e repetidamente na calça] nunca entrou um tostão de dinheiro público”, ouviu alguém na multidão replicar, a plenos pulmões: “estreando roupa nova, governador?”.
Não, Adhemar de Barros não era um alagoano do interior. Chegou a ser, por duas vezes, candidato a presidente da República (1955 e 1960) e poderia ter ganho. Osvaldo Moreno, em contraste, era um alagoano do interior. Pois foi ele quem levou Adhemar no bico, não o contrário. Era a polícia descobrindo as coisas, à medida que as investigações sobre o falso Bahia iam avançando. Agora irei citar uma reportagem de 22/11/1954, divulgada em muitos jornais dos Diários Associados, a rede que, então, pertencia ao notório Assis Chateaubriand.
No Diário da Tarde, de Curitiba, por exemplo, a matéria ganhou o título “O vigarista fazia ponto na Assembleia Legislativa”. Em O Jornal, do Rio de Janeiro, “Deputados, prefeitos, comerciantes e políticos lesados pelo hábil ‘scroc’”.
Trata-se de Osvaldo Soares Bahia, que foi desmascarado inicialmente logo no início (sic) de 1950, foi processado e a Justiça interditou-o recolhendo ao Manicômio Judiciário [a matéria anterior falava em Penitenciária estadual].[xiv]
“Osvaldo Soares Bahia surgiu inesperadamente nesta capital”, prossegue o relato, “e procurou o então governador Adhemar de Barros, no Palácio dos Campos Elísios. (...) Contou-lhe que tinha fugido de Alagoas, onde era deputado estadual e presidente da Assembleia Legislativa, dadas as perseguições que lhe movia o governador. Fora obrigado até a matar duas pessoas”. (Esta foi a mentira mais importante e bem na linha de como se fazia política em Alagoas, naquele tempo. Talvez, ainda hoje?) “Pedia asilo em São Paulo e esperava mesmo o amparo necessário para não cair nas garras de vários capangas que tinham sido colocados em seu encalço, com ordem de matá-lo”.
Continua a matéria:
O Sr. Adhemar de Barros mandou colocá-lo num Hospital, sob severa vigilância de elementos do DOPS [Departamento de Ordem Política e Social], ao mesmo tempo em que lhe fornecia até dinheiro, para completa substituição de seu guarda roupa, já bastante desfalcado, dada a pressa com que fora obrigado a fugir.
Pouco depois disso, o DOPS (um setor da polícia estadual) fez uma consulta a Maceió e foi informado de que Osvaldo Soares Bahia “nunca fora elemento político, não exercera mandato e era um refinadíssimo estelionatário”. Apesar de tão retumbantes revelações, o assunto não teve prosseguimento, nem foi Osvaldo processado, naquela ocasião, “porque, afinal de contas, a vítima tinha sido o próprio governador e não ficava bem ele aparecer no inquérito policial”.

Cena de faroeste na Assembleia

Superado o episódio com o governador, o alagoano passou a percorrer o interior de São Paulo, visitando os políticos de cada cidade, onde passou a se apresentar como prefeito de Maceió. Numa dessas, foi pego (novamente). Não esmoreceu, todavia, apenas mudou de área de atuação: do Executivo para o Legislativo.
Insinuante como é, falando pausadamente, apontando o governador Arnon de Melo como autor das perseguições, Bahia escolheu a Assembleia Legislativa como lugar ideal para manter um estranho escritório de estelionatos [!]. Em pouco tempo, fez amizade com quase todos os deputados e ali aparecia diariamente. A fórmula empregada para arrancar dinheiro dos representantes do povo [era] a mais variada possível pois, [ora] Osvaldo se apresentava como usineiro [ora] como industrial. A conveniência ditava a sua posição.
O repórter prossegue: “por mais incrível que pareça, não é ele [Osvaldo] um tipo de inteligência invulgar, não tem personalidade, convencendo tão somente pela maneira pausada de falar e [pelo fato de se vestir] decentemente. Provoca comiseração e é o que ele deseja, para o melhor êxito de seus golpes”. (Mais uma vez, um repórter idiota é engabelado pelas pessoas a quem entrevista: foram os deputados que lhe disseram isso, a fim de que a mensagem fosse publicada no jornal. Inteligentes eram eles, os políticos que caíram na conversa do alagoano; esse, que os enganou, era, somente, digno de pena!)
Pois foi Osvaldo Moreno, com sua pouca inteligência quem arrancou apenas com a conversa quase uma fortuna do inteligentíssimo deputado Athié Jorge Coury, figura muito conhecida por ter sido, também, presidente do Santos Futebol Clube, de 1945 a 1971, período que cobre os anos mais gloriosos do clube de Pelé. Continuo a citar a mesma reportagem:
A última vítima de Osvaldo Soares Bahia foi o deputado Athié Jorge Coury. Conversaram demoradamente e o deputado paulista resolveu levá-lo para seu domicílio na cidade praiana [Santos]. Depois, o sr. Athié, atendendo proposta vantajosa (sic), entregou-lhe 60 mil cruzeiros, prometendo fazer a entrega de mais 40 mil cruzeiros na tarde de ontem.
Aconteceu que, logo ao chegar a São Paulo, no dia seguinte, o deputado ficou sabendo que Osvaldo Soares Bahia era um estelionatário e, imediatamente, se comunicou [com o Departamento de Investigações] pedindo a prisão do acusado. Desconhecendo esses fatos, Osvaldo chegou à Assembleia antes da polícia e se dirigiu ao gabinete do deputado Athié, a fim de receber os 40 mil cruzeiros que este lhe havia prometido. Quando lá chegou,
O sr. Athié perdeu completamente a calma. Sacou do revólver que levava à cintura e investiu furiosamente contra o homem que fora seu hóspede.
-- Ou você me devolve o dinheiro ou eu lhe mato!
(Bem, a frase publicada foi: “Ou você me devolve o dinheiro ou eu lhe bato”. Das duas, uma: ou o linotipista que compôs a matéria na oficina do jornal trocou o “m” pelo “b”, ou o repórter, decididamente, estava de má fé e deturpou a frase, para proteger o deputado. Alguém que se descobrisse roubado iria jamais apontar um revólver para o vigarista e lhe dizer: “Ou você me devolve o dinheiro ou eu lhe bato”? Não parece coisa de criança? Tenha paciência.) Continuo:
Justamente nesse momento, o delegado interveio, impedindo o estravagamento (sic) do parlamentar. Preso, Bahia foi levado para o Departamento de Investigações, realizando a polícia várias diligências para a apreensão do dinheiro.
Somente uma parte foi recuperada, como seria de esperar.
A matéria se encerra dando a relação de vítimas do vigarista. Além de vários outros deputados, aparece Jânio Quadros, que ainda viria a ser governador do Estado e presidente do Brasil. Mas o caso mais interessante foi o do deputado Porfírio da Paz, que havia escrito uma carta para o vigarista “com dizeres categóricos, como prova de amizade”, documento utilizado pelo alagoano de Viçosa “para lesar importantes firmas desta capital”.
Todo mundo era inteligente, na Assembleia Legislativa de São Paulo. O único burro foi aquele que enganou as sumidades.

Apogeu de uma carreira

Justiça se lhe faça: Osvaldo Moreno não fugia ao trabalho, nem se dobrava após ocasionais insucessos. Preso em São Paulo, em novembro de 1954, no rumoroso caso da Assembleia Legislativa, o meliante foi, logo em seguida, solto e já em abril de 1955 estava pronto para dar o mais vistoso golpe de sua carreira. Tinha de ser em outra cidade (Mobilidade é tudo!), entretanto, e ele escolheu Niterói, a capital do Estado do Rio de Janeiro. Desta vez, as vítimas seriam os (possivelmente, inteligentes) deputados estaduais.
Ao chegar no recinto da Assembleia, Osvaldo informou na portaria ser um deputado alagoano. Ato contínuo, sua entrada foi não apenas permitida como logo se formou uma comitiva de parlamentares com o fim de levá-lo ao plenário, onde sua presença foi anunciada. Um deputado de seu (alegado) partido, depois de conversar poucos minutos com o visitante, saudou-o publicamente.
Depois, subindo à tribuna, o homenageado proferiu discurso que foi uma sensacional narrativa de assassínios cometidos em pessoas de sua família por inimigos políticos: seu pai, sua esposa, sua filha, seu irmão... Só ele vinha escapando à sanha dos adversários.[xv]
O tema das perseguições políticas e dos assassinatos em série de seus familiares vinha de longe, como sabemos. Osvaldo acrescentou:
Agora, desejavam os seus correligionários da UDN fazê-lo candidato ao governo do Estado; mas, embora tivesse sido eleito à Assembleia alagoana por 45 mil votos [53 mil, segundo outros jornais] e fosse homem de fibra, além de rico – revelou que pesava 65 quilos, ao entrar na política, e não ter, presentemente, mais de 45, e ser possuidor das duas maiores fábricas de tecidos de Alagoas – não queria aceitar o cargo e viera para o Rio a fim de entender-se com o sr. Tenório Cavalcante [notório político da Baixada Fluminense, alagoano de nascimento] e outros próceres.[xvi]
A reportagem acima foi publicada em 23 de abril, três dias depois de o evento ter acontecido. Mas, a melhor cobertura do espetáculo proporcionado pelo alagoano de Viçosa tinha sido dada já no dia anterior pelo Diário Carioca. Como a farsa, encenada à tarde, foi descoberta na noite do mesmo dia (20/4), os jornais do dia 22/4 tiveram a oportunidade de denunciar o ridículo a que o vigarista havia exposto os políticos. Somente o Diário Carioca explorou esse veio com o sarcasmo devido. “Deputado alagoano deu show”, dizia o título da matéria. (Já se sabia que Osvaldo Soares Malta, o nome, desta vez, adotado pelo vigarista, não era deputado coisa nenhuma, mas o Diário não perdeu a oportunidade de considerá-lo como tal, para recuperar o clima da reunião do dia anterior.)
A Assembleia fluminense recebeu ontem (dia de pagamento de seus deputados), com todas as honras de estilo, a visita do deputado alagoano sr. Osvaldo Soares Malta, que foi saudado pelo seu correligionário naquela Assembleia, deputado udenista, sr. Serpa Carvalho.[xvii]
Ocupando a tribuna para um discurso de agradecimento, o deputado visitante, após se anunciar primo do senador Rui Palmeira, revelou ter sido eleito por 53 mil votos [um terço do eleitorado total de Alagoas, à época!] em seu pequeno Estado, cujo governador, sr. Arnon de Melo, ficara de lhe enviar 150 mil cruzeiros, através de um banco desta capital.
O sr. Osvaldo Soares Malta afirmou, perante os seus colegas fluminenses, a seguir, que seria candidato ao governo de Alagoas por uma coligação formada por todos os partidos daquele Estado, pois o deputado Tenório Cavalcante, anteriormente indicado, recusara a indicação de seu nome, alegando motivos políticos. O deputado, traçando a seguir o quadro da atual situação política de Alagoas, afirmou ter sido a sua família praticamente dizimada por inimigos políticos e acrescentou ser proprietário de duas fábricas de tecidos e duas usinas.
Após a saída do deputado udenista alagoano, o líder da UDN na Assembleia fluminense, deputado Saramago Pinheiro, estranhando o fato do sr. Osvaldo Soares Malta ter sido eleito em Alagoas por tão apreciável soma de votos, telefonou ao senador Rui Palmeira, para pedir confirmação, tendo sido então informado de que o visitante da Assembleia não é seu parente, conhecendo-o de fato ele, senador, mas apenas como escroque.
A matéria é toda uma grande gozação (que diferença daqueles repórteres bobos ou desonestos do Diário de Pernambuco – que comprou sem crítica as fantasias de Osvaldo Moreno -- e dos Diários Associados, que chamou o vigarista de burro para enaltecer a inteligência dos otários a quem ele tinha enganado). A sátira começa com o “Deputado alagoano” sem aspas, ou seja, fazendo de conta que se está levando a sério o título. Continua com a inserção (“dia de pagamento dos srs. Deputados”) que seria inteiramente fora de lugar se não conduzisse a mensagem de que o real propósito do falso deputado era arrancar dinheiro de seus “colegas”.
Três dias depois de ter ocorrido, a recepção oficial de Osvaldo Moreno (aliás, naquela ocasião, Osvaldo Soares Malta) pelos deputados do Rio de Janeiro continuava repercutindo na imprensa. Na edição de 24 de abril, O Fluminense, de Niterói acrescentou a importantíssima explicação de como o vigarista alagoano tentou se valer de sua condição de “deputado” para extorquir dinheiros de seus “colegas”.
Não foi o fato mais curioso da semana, o de um escroque haver sido recebido na Assembleia na condição de deputado estadual em Alagoas, como ocorreu quarta feira última, mas sim o fato mais curioso e sensacional de todos os tempos na Assembleia Legislativa, pois jamais aconteceu tal coisa, nem mesmo parecida.[xviii]
Em seguida a este parágrafo introdutório, a matéria descreve o que se passou naquela tarde. Menciona que o falso deputado foi recebido oficialmente, a ele foi oferecida uma cadeira na Mesa Diretora dos trabalhos, houve a fala de saudação, à qual Osvaldo respondeu proferindo “um discurso que bem poderia ser o de um verdadeiro deputado”. Quando ele terminou, foi aplaudido e a sessão continuou normalmente. É a partir daí que a tentativa de conseguir o almejado dinheiro entra na sua fase “operacional”, por assim dizer.
Acontece, porém, que Malta, ao invés de se retirar definitivamente, procurou o líder udenista, Sr. Saramago Pinheiro, em sua sala, mantendo com este longa conversa, finda a qual (e aí começa o conto de vigário!) declarou que estava esperando um dinheiro que lhe ia enviar o governador de Alagoas pelo Banco do Brasil, mas não sabia onde estava localizada a agência daquele estabelecimento em Niterói...
O líder Saramago, não entendendo até onde Malta pretendia chegar, pôs à disposição seu secretário particular, a fim de levá-lo até o Banco do Brasil. E lá foi o Malta até o Jardim São João, perguntando, na frente do referido secretário, se o dinheiro a ele destinado havia chegado. A resposta, claro, só podia ser uma: -- Não!
Malta, então, regressou à Assembleia – aí o ponto culminante – com o objetivo de comunicar ao líder de sua correspondente bancada alagoana que, não tendo chegado o dinheiro que lhe seria remetido pelo governador Arnon de Melo, ele só tinha uma alternativa: sacar algum por conta dos “colegas”, a título de adiantamento, que lhe seria devolvido horas depois.
Sendo dia de pagamento dos deputados (o que Malta deveria saber), não seria difícil o golpe.
Infelizmente, para o golpista, deu errado. Ao retornar o alagoano à Assembleia, Saramago não pôde atendê-lo de imediato. Enquanto aguardava, o visitante foi interpelado pelo chefe de segurança, que desconhecia sua condição de “deputado” e perguntou quem era ele. Osvaldo teve medo de que a farsa houvesse sido descoberta e fugiu sem levar um tostão. Para sua sorte, pois, pouco depois, por telefone, o senador Rui Palmeira (o Senado Federal ficava, à época, do outro lado da Baía da Guanabara) daria o serviço: “o Malta, além de doido, era, de fato, um escroque”.

Depois de preso, quis se regenerar

Frustrado o golpe, Osvaldo rapidamente voltou para São Paulo, onde já era conhecido das autoridades. Graças a uma foto sua publicada em jornal carioca, mas que também circulava em outras cidades (o Diário da Noite), a polícia paulista identificou o falso deputado Osvaldo Soares Malta como sendo o mesmo Osvaldo Soares Bahia que tantos golpes aplicara nos deputados desse Estado. Assim, menos de uma semana depois de ter encenado o espetáculo no Rio de Janeiro, Moreno foi, novamente, preso. A polícia o encontrou “escondido debaixo da cama”.
Cerca das 11 horas de domingo, na rua Quatro, 28, em Vila Lara [São Paulo], um policial da Delegacia de Roubos efetivou a prisão de Osvaldo Moreno. (...) Encontrava-se ele ao ser detido escondido embaixo de um colchão, entre este e o estrado da cama. Conduzido ao Departamento de Investigações, foi recolhido ao xadrez, à disposição da Delegacia de Roubos.[xix]
No mesmo dia em que foi encontrado escondido embaixo do colchão, o vigarista falou à imprensa para dizer que sua única intenção ao se passar por deputado no Rio de Janeiro fora se divertir. Não sei se ficou, mesmo, preso, nem se respondeu a processo. Sei que, em julho do mesmo ano, ele procurou um repórter dos Diários Associados. “Queria dar uma entrevista para dizer que desejava um crédito de confiança, pois iria se regenerar, isto é, trilhar o caminho do bem. Jurou de dedo em cruz que não ludibriaria mais ninguém.”[xx]
Contou, então, Osvaldo Soares Bahia, que acabara de adquirir um estabelecimento comercial por 400 mil cruzeiros, no Largo de Pinheiros [São Paulo], conforme documentação que nos exibiu, estando pronto para iniciar suas atividades como comerciante. Desistira de ser “deputado” e “exilado político de Alagoas”.
Prosseguiu dizendo que sua atitude foi motivada pelos conselhos recebidos do Juiz Corregedor, “que o fez assinar um termo de bem viver”. Tendo o seu “mandato cassado pela autoridade policial” (a expressão é do repórter), “Osvaldo quer fazer jus ao arquivamento de suas queixas, razão pela qual nos procurou dizendo que se encontrava disposto a iniciar nova vida”.
Em seguida, o conhecido “escroc” – agora, ex-“escroc” – teve oportunidade de declarar que, em seus “golpes”, conseguira levantar a soma de 10 milhões de cruzeiros [4.167 salários mínimos daquele ano], sendo que possui no momento, além do estabelecimento comercial a que se referiu, uma casa e um terreno em Água Fria e um “Nash” [automóvel] 1951, tudo produto de sua ação criminosa, que agora fará reverter em benefício de sua reabilitação perante a sociedade.
Não sei se o repórter acreditou. A mim me parece que ele estava, apenas, criando o clima para aprontar mais uma. De qualquer modo, o fechamento da entrevista é hilariante, parecendo uma maneira de o vigarista tripudiar sobre seus otários:
Minhas próprias vítimas afirmaram que devo aproveitar o dinheiro que lhes extorqui dessa maneira. Diante disso, creio não haver mais nenhum problema para a minha recuperação.
Depois disso, só consegui localizar mais duas notícias sobre Osvaldo Moreno. Em outubro do mesmo ano de 1955, ele anunciava ser candidato a vereador: “Embora envolvido em numerosos processos, Osvaldo Soares Bahia (...) conseguiu que um partido o inscrevesse à vereança. (...) Se deixou de viver desonestamente, não abandonou a ideia de se tornar político. Caso não seja eleito, quem sabe, volte a dar trabalho, pois o homem não sabe viver sem as ‘imunidades parlamentares’”.[xxi]
Finalmente, em julho de 1957, a notícia final:
O “rei dos malandros” do Brasil, que por muitas razões tinha esse título, foi assassinado há pouco, em Belém do Pará. Trata-se do marginal Osvaldo Soares Bahia, “vigarista” com inúmeras passagens por todas as polícias do Brasil.[xxii]
O redator faz, em seguida, um resumo da obra de Osvaldo Moreno (aparentemente, a polícia de São Paulo nunca registrou seu verdadeiro nome, apesar das notícias que recebeu, em devido tempo, de Alagoas) dando destaque aos golpes dados por ele nos deputados de São Paulo e à encenação teatral que protagonizou na Assembleia do Rio de Janeiro. Concluiu desta forma:
Mas o vaso tanto vai à fonte que um dia se quebra. Já cansado de aplicar golpes cá no Sul, Bahia voltou ao Norte. Lá, ficou noivo de uma jovem de boa família e já estava com o casamento marcado quando a família da noiva soube quem era o rapaz. Envergonhados por causa da situação, o pai e dois irmãos da moça “costuraram” Bahia de facadas, em plena praça pública, prostrando-o morto.
Terminou, assim, a história de Osvaldo Moreno, ou Badu, o falso Bahia. A menos que ele não tenha, de fato, morrido, mas apenas dado o golpe de mestre de inventar essa história. Neste caso, pode ainda estar vivo, aos 87 anos, rindo de todos os que acreditaram em sua morte.
Osvaldo Bahia, aliás Osvaldo Brandão, aliás Aluísio Brandão Bahia, aliás Carlos Brandão Bahia, aliás Osvaldo Soares Malta, aliás Osvaldo Soares Bahia, aliás Osvaldo Brandão Vilela Bahia, aliás Manuel Vilela, aliás Antônio dos Santos, aliás Osvaldo Moreira, aliás Antônio Malta, aliás Carlos Vilela, aliás “Malta”, aliás “Rocha”, aliás José Malta, aliás Mário Bahia talvez não gostasse de saber que, pelo menos a mim, seu “sobrinho-neto”, ele jamais enganou.
Recife, Alto do Céu, 27/1/2018





[i] A Noite (Rio de Janeiro), 17/10/1947, pág. 12, edição 12.698. (Todas as citações de jornais remetem à Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional, disponível na internet.),
[ii] Verbete “Viçosa (Alagoas) na Wikipedia, em https://pt.wikipedia.org/wiki/Vi%C3%A7osa_(Alagoas)
[iii] Diário de Pernambuco, 17/2/1945, pág. 2.
[iv] Todas as citações seguintes, até aviso em contrário, são de “Tuberculoso detido há 64 dias no D. I. C.”, Diário de Pernambuco, 17/2/1948, pág. 5.
[v] “Afinal, resolvida a situação do tuberculoso e sua família”, Diário de Pernambuco, 18/2/1948, pág. 2.
[vi] Todas as citações seguintes, até aviso em contrário, são de “Ainda em foco o caso Brandão. Escreve ao Diário o bispo de Petrolina, Dom Avelar Brandão Vilela”, Diário de Pernambuco, 21/2/1948, pág. 5.
[vii] “Pedida a prisão preventiva do estelionatário Osvaldo Soares Bahia”, Jornal de Notícias (SP), 17/5/1950, pág. 2. Todas as citações seguintes, até aviso em contrário, são dessa matéria.
[viii] “Dizia-se irmão do bispo de Petrolina”, Diário de Pernambuco, 23/5/1950, pág. 12.
[ix] “Novos detalhes sobre as proezas do jovem estelionatário alagoano”, Jornal de Notícias (SP), 25/5/1950, pág. 2.
[x] “Alagoano das Arábias”, A Noite (RJ), 3/6/1954, pág. 8.
[xi] “Vigarista alagoano agindo em São Paulo”. Diário da Noite (RJ), 5/12/1953, pág. 5.
[xii] “Alagoano das Arábias”, A Noite (RJ), 3/6/1954, pág. 8.
[xiii] “Alagoano das Arábias”, A Noite (RJ), 3/6/1954, pág. 8.
[xiv] “Deputados, prefeitos, comerciantes e políticos lesados pelo hábil ‘scroc’”. O Jornal (RJ), 22/11/1954, pág. 6. As citações seguintes são dessa mesma fonte, até menção em contrário.
[xv] “Recebeu homenagens na Assembleia fluminense”, Diário de Notícias (RJ), 23/4/1955, pág. 6.
[xvi] “Recebeu homenagens na Assembleia fluminense”, Diário de Notícias (RJ), 23/4/1955, pág. 6.
[xvii] “Deputado alagoano deu show”. Diário Carioca (RJ), 21/4/1955, pág. 1. As citações seguintes são dessa mesma fonte, até aviso em contrário.
[xviii] “O ‘deputado’ tentou passar o ‘conto’ na Assembleia Legislativa”, O Fluminense (RJ), 24/4/1955, pág. 1. As citações seguintes, até aviso em contrário, são da mesma fonte.
[xix] “Preso, escondido debaixo da cama, o charlatão que ludibriou os parlamentares fluminenses”. Diário da Noite (RJ), 26/4/1955, pág. 6.
[xx] “Famoso vigarista quer se regenerar”. Diário da Noite (RJ), 23/7/1955, pág. 5. As citações seguintes são dessa mesma fonte, até aviso em contrário.
[xxi] “Preso, há tempos, como falso deputado, agora é candidato autêntico”. Diário da Noite (RJ), 6/10/1955, pág. 6.
[xxii] “Deu um santinho ao chefe, abençoou a guarda e sumiu”. A Noite (RJ), 8/7/1957, pág. 4. A citação seguinte tem a mesma origem.