Este é o Comendador Peixoto, vapor contemporâneo, porém maior que o Penedinho. Afundou no início da década de 1960, quando já não fazia mais a linha regular Piranhas-Penedo. |
Há um episódio que me diz respeito pessoalmente e tem a ver com a velha navegação a vapor (1867-1979) no Baixo São Francisco, entre Piranhas e Penedo, Alagoas. Envolve o navio Penedinho,
sobre o qual minha mãe contava muitas histórias. Ela foi passageira daquela
embarcação -- uma única vez, e por razões as mais imprevisíveis. (Como
informa Etevaldo Amorim, historiador, em seu blog, “o vapor Penedo -– também conhecido por
Penedinho -– operou até finais da década de 1950”.)
Minha mãe se impressionou,
sobretudo, com os milagres de aproveitamento de espaço nos minúsculos camarotes
do Penedinho. Também falava muito da informalidade da viagem, que incluía, com
frequência, paradas não programadas, para compartilhar intermináveis almoços
oferecidos aos viajantes pelos habitantes dos lugarejos ou das fazendas
ribeirinhas. Nessas ocasiões, parecia que o tempo parava, ninguém tinha pressa.
Nem mesmo o comandante do navio.
-– Mas como, afinal, minha
mãe foi parar no Penedinho?
Provavelmente, no final de
1941 ou início de 1942, Stella Cardoso Pedrosa, que viria a ser minha mãe,
viajou em férias ao Rio de Janeiro, na companhia de sua prima Carmita. Ambas, à época, solteiras, com idades próximas a 24 anos. Do Recife
ao Rio de Janeiro, elas podem ter ido de avião ou de navio. Desconheço qual
tenha sido a escolha.
Pouco depois de chegarem à
capital da República, entretanto, foram surpreendidas com o início, em
fevereiro de 1942, do torpedeamento sistemático de navios brasileiros pelos
submarinos da Alemanha e da Itália. (Ao todo, 33 navios brasileiros foram
afundados, parte nas costas do Brasil, parte nas dos Estados Unidos e em outros
mares.) Como medida de precaução, as viagens de navios pela costa brasileira
foram suspensas ou, pelo menos, grandemente limitadas. Lembro-me
de Stella haver feito referência a estes fatos, como prelúdio às suas histórias
sobre o Penedinho.
A suspensão das viagens de
navios criou um problema para o retorno ao Recife de Stella e Carmita. Por
causa da guerra, não havia vagas para civis na aviação comercial: os assentos
eram sempre requisitados pelos militares. Tampouco existia a possibilidade de se
vir, exclusivamente, por terra, pois as estradas de rodagem ou de ferro que
havia não conectavam o Sul (hoje diríamos Sudeste) ao Norte (ou seja, ao
Nordeste). Não ao Recife, com certeza.
Como, então, as duas
conseguiram chegar a Piranhas, para, dali, embarcar no Penedinho? Não sei.
Podem ter ido por terra do Rio a Pirapora, Minas, e dali ter tomado um vapor
que as levaria a Jatobá (hoje, Petrolândia), em Pernambuco. De Jatobá a Piranhas, se podia ir de trem,
usando a ferrovia de Paulo Afonso (1883-1964). Uma alternativa, que me parece, levemente,
mais provável, seria elas terem ido de trem do Rio de Janeiro a Salvador e, desta
cidade, seguido até Juazeiro, também de trem. De Juazeiro a Jatobá, de onde
poderiam continuar em ferrovia até Piranhas, é uma distância, relativamente,
curta.
Pode ter sido de um jeito
ou de outro. Não tenho lembrança de Stella falar sobre esta parte de sua viagem.
Em contraste, os dias que ela passou embarcada no Baixo São Francisco, fugindo dos submarinos alemães, foram marcantes.
A ponto de o Penedinho ter-se tornado, em casa, quase uma pessoa da família.
Gustavo Maia Gomes
(20/1/2014)
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