segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Papai Noel, enforcado, está vivo



Gustavo Maia Gomes


Em 24 de dezembro de 1951, o personagem conhecido como Papai Noel morreu na forca e foi queimado, em seguida, sob a acusação de transformar o Natal num evento de consumo. Isso ocorreu na catedral de Dijon, França. Os padres locais aprovaram tudo, mas não conseguiram evitar que o morto reaparecesse, alguns dias depois, na mesma cidade. Lépido e fagueiro, curtindo sua fama, que não é pouca.
Nem pouca, nem surpreendente: uma vez por ano, o velho recebe mais propaganda gratuita do que Jesus Cristo, seu patrão e aniversariante do mês. De fato, Papai Noel é o Natal, evento que provoca euforia no comércio, sustenta tanto a indústria de enfeites quanto uma multidão de inventores esquisitos, e ainda motiva a produção de inúmeros artigos acadêmicos. Nos Estados Unidos, sobretudo, mas não exclusivamente.
A produção científica sobre a festividade, movida a dinheiro e povoada de estudos duvidosamente relevantes, é pouco conhecida. Vale ter uma breve notícia dela, assim como dos inventos natalinos: bugigangas patenteadas, que, em conjunto, refletem e ajudam a sustentar a prosperidade movida pelas compras.
NATAL CIENTÍFICO
Do que os estudiosos andam pesquisando sobre temas de Natal, vai aqui uma pequena amostra, encontrável na internet:
1. Ray Cradick testou a hipótese de que os desenhos de Papai Noel aumentariam de tamanho até o Natal, mas se tornariam menores depois. Parece que as figuras, realmente, crescem antes da festa, mas não diminuem, depois. Assim, terminarão maiores que o consultório psiquiátrico onde são desenhadas.
2. A contribuição de Eileen Fischer e Stephen J. Arnold para o conhecimento humano é a descoberta de que os homens que “sustentam atitudes igualitárias em relação ao papel dos gêneros se envolvem mais na compra de presentes natalinos”. Ou seja, se comportam como as mulheres. Embora pareça banal, chegar a tanto custou caro: eles entrevistaram 299 pessoas.
3. Joel Waldfogel afirma ser muito improvável que, ao dar um presente, o doador escolha exatamente aquilo que o beneficiado compraria com o mesmo dinheiro. Em todos os outros casos, isso não ocorreria. A discrepância pode ser interpretada como uma perda social de bem-estar. Que fazer? Nem eu sei nem, aparentemente, ele.
4. James Hillard e colaboradores reconhecem existir a crença de que a época do Natal está associada à maior incidência de crises psicóticas. Chegaram à conclusão contrária: há um decréscimo delas. Infelizmente, passado dezembro, o que tinha caído volta a subir. Os doentes ficam sem nenhum benefício líquido; só os médicos ganham, pois têm mais tempo para fazer as compras natalinas que o mundo todo lhes cobra.
Em resumo, a literatura técnica especializada trata dessas coisas. Assim como o Natal, propriamente dito, é movido a reais, dólares e décimo-terceiro salários, a produção acadêmica a ele associada também responde aos impulsos do mercado e aos financiamentos governamentais. Existem os financiadores e os que querem ser financiados. Portanto, aparecem as pesquisas. Mas talvez haja dinheiro demais. Considerando algumas das coisas que têm sido estudadas, esta é uma possibilidade.
NATAL INDUSTRIAL
Passemos agora para o lado prático da coisa: as invenções natalinas e suas respectivas patentes concedidas pelo governo. Um homem inventou o disco CD em forma de árvore de Natal. (Deve ser um problema, aquele negócio triangular girando a alta velocidade. Poderia cortar um dedo desavisado.) Outro, um clipe para luzes natalinas. O terceiro, um suporte de luzes para colocar no telhado. Há, também, uma varinha sustentando pequenas luminárias. (Meio afetada, a tal varinha.) Um besteirol completo.
Felizmente, bem pesadas as coisas, a sobrevivência da humanidade independe desses inventos. Mas a lição que fica é outra: os que patenteiam varinhas ornamentais ganharão dinheiro com elas. E a soma dos ganhos com varinhas, luzes, clipes, suportes e tudo o mais termina sendo parte da diferença entre os países onde a burguesia “faz maravilhas” (para usar a expressão de Marx e Engels no Manifesto Comunista) e aqueles onde ela está proibida de fazê-las. Quem quiser que prefira estes últimos. Não é meu caso. A mim, custa muito menos aturar Papai Noel uma vez por ano do que custaria ter de aguentar Fidel Castro o ano inteiro.

Este artigo será publicado, simultaneamente, em http://www.blogdatametrica.com.br, http://www.econometrix.com.br e http://www.gustavomaiagomes.blogspot.com (19 dez 2011)

Referências
Ray A. Cradick, “Size of Santa Claus drawings as a function of time before and after Christmas”. Journal of Psychological Studies, Vol 12(3), 1961, 121-125.
Eileen Fischer and Stephen J. Arnold, “More than a labor of love: gender roles and Christmas gift shopping”. Journal of Consumer Research, Dec 1990.
Joel Waldfogel, “The deadweight loss of Christmas”. American Economic Review, vol. 83, n. 45, n. 5, Dec. 1993.
James R. Hillard, Jacqueline M. Holland, and Dietolf Ramm, “Christmas and psychopathology: Data from a psychiatric emergency room population”, Archives of General Psychiatry, 1981; 38 (12).

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