terça-feira, 13 de março de 2012

Quem matou Itamaracá, Maria Farinha, Pontas de Pedras...?

Há trinta, quarenta anos, as praias de Itamaracá, Pontas de Pedras, Pau Amarelo, Conceição, Maria Farinha eram a esperança turística de Pernambuco. Hoje, aquilo é uma terra arrasada, aonde os turistas fazem questão de não ir. Quem matou o Litoral Norte foi uma sucessão de prefeitos irresponsáveis e de governadores descuidados. (Confira a lista, ao final desta matéria.) É preciso impedir a repetição disso, no futuro que já começou.
De fato, com a próxima instalação da montadora de automóveis Fiat, da Hemobrás, da fábrica de vidros e de muitos outros empreendimentos privados, os municípios onde estão aquelas outrora paradisíacas praias experimentam, neste momento, a iminência de uma revolução econômica. Mas o otimismo em relação ao futuro contrasta com o passado recente. Não estará o Litoral Norte vivendo as vésperas de outra frustração?
DEPENDE DAS PREFEITURAS

Depende de como as prefeituras e o governo estadual agirão, desta vez. A História os condena. Ao permitir que sucessivas, numerosas, graves infrações urbanas fossem cometidas, eles são culpados pela situação lastimável a que se chegou. Recuperar o que foi danificado é possível, mas custa caro e depende de uma visão estratégica que o poder público local e estadual jamais demonstrou ter. Depende, também, e principalmente, da fiscalização permanente, para que novas infrações não sejam cometidas.
Podemos crer que os prefeitos do futuro produzirão as soluções para os infinitos problemas que os prefeitos do passado criaram? (Ainda mais que, em alguns casos, os incompetentes de ontem são os mesmos de hoje?) Os otimistas diriam que sim. Já o resto do mundo...
Esta reportagem trata disso: ela contém flagrantes do caos urbano em que foram transformadas as praias do Litoral Norte pernambucano. Uma segunda, a ser publicada em breve, mostrará iniciativas meritórias, na mesma região ou em outras, que têm contribuído para minorar os problemas. E, atenção, não estou dizendo que Porto de Galinhas, a joia da Coroa do Litoral Sul, esteja muito melhor. Sobre isso, já escrevi, neste mesmo espaço ("Porto de que galinhas?") .


ITAMARACÁ: CAMINHE 300 METROS, ANDE CINQUENTA
Duas irregularidades saltam à vista na foto acima, captada do Google Earth. Há muitas outras; Itamaracá não é modesta em criar problemas, nem seus prefeitos.

Primeira irregularidade. Ou a Prefeitura jamais fez um traçado prévio das ruas que deveriam ser abertas à medida que as áreas fossem sendo ocupadas; ou, se o fez, o projeto deve ter sido entregue ao mesmo arquiteto que desenhou o prédio da reitoria da Universidade Federal de Pernambuco, seguramente, o pior mondrongo que alguém poderia conceber.
Se houve planejamento, mesmo ruim, ele não deve ter previsto a construção futura de uma avenida que, paralela ao mar e dele distante apenas 50 metros, tem vários trechos de 500 ou 600 metros sem uma única saída para a praia. Mas o fato é que isso existe. Claramente, portanto, o problema não apareceu, apenas, devido à falta de planejamento, mas de mínima fiscalização. As construções irregulares foram se amontoando e invadiram o que poderia ter sido pensado como futuras ruas. Mas, quem estava lá para impedir isso? Não aqueles prefeitos.
Segunda irregularidade. A regra da bagunça é: se há praia, vamos construir, mesmo que isso contrarie todas as normas urbanas, ambientais, sanitárias, ou de simples bom senso.
Quem estava lá para impedir? Não aqueles prefeitos.


HOUVE GUERRA EM PAU AMARELO?

O entorno do forte de Pau Amarelo, em Paulista, é um lugar histórico. Virou um desastre urbano. Ele tem tudo o que não deveria ter – e nada do que deveria.
Tem:
·   Bares amontoados (encobertos pelas árvores, na foto mais alta, mas visíveis a quem passa no local) ou invadindo o espaço público, como mostrado na parte inferior da foto imediatamente acima
·   Casas invasoras cruzando o que parece ser uma rua projetada, a “Luxemburgo”
·   Barracos e casas quase dentro do mar, desvalorizando o monumento histórico
·   Lixo abundante infrequentemente coletado, e
·   Enormes poças d’água, quando chove.
Não tem:
·   Um só equipamento de lazer
·  Grades isolando a área, para evitar sua utilização indevida (como têm os parques da Jaqueira e 13 de Maio, no Recife, por exemplo)
·    Iluminação adequada
·   Qualquer coisa que humanize o lugar, tornando-o aprazível.
Com tantos tens e tantos não-tens, o entorno tornou-se um lugar horroroso que, ao invés de atrair turistas, afugenta-os. Mas não consta que nenhum dos prefeitos que administraram a cidade enquanto tamanho absurdo ia sendo produzido tenha sido processado e preso. Pelo menos, não por isso.
Ainda é tempo. 

PONTAS DE PEDRAS: CASAS DENTRO DO MAR

Pontas de Pedras, em Goiana, não fugiu à regra: dedicou os últimos 30 anos a produzir um caos urbano impossível de se corrigir totalmente. A foto acima, também colhida no Google Earth, mostra alguns desses problemas. Ruas que se formaram, nitidamente, entre as brechas deixadas pelas casas (ao invés de as casas terem se localizado “entre as brechas” deixadas pelas ruas, como seria correto); construções, praticamente, dentro do mar. 

Esses problemas se tornaram “estruturais” e, portanto, a esta altura do campeonato, muito difíceis de resolver. Mas praças que parecem teatros de guerra não comportam nomes bonitos, como “problemas estruturais”. São evidências de irresponsabilidade gerencial.

E o que faziam e fazem os prefeitos de Goiana, enquanto o pesadelo urbano chamado Pontas de Pedras ia e vai se tornando cada vez mais sério?



MARIA FARINHA: PARAÍSO PERDIDO


A foto acima é um retrato atual da praia de Maria Farinha, em Paulista. A casa cujo muro aparece à esquerda é irregular: com toda probabilidade, infringe em muitos metros o recuo legal em relação ao mar. Dos bares, então, nem se fala. Por que se permitiu que isso fosse acontecendo, ao longo dos anos? Como se permite que isto continue a acontecer, hoje?

Na década de 1960, Maria Farinha era um paraíso, com poucas casas e um mar lindo. Mas já era verdade que quem quisesse construir ali, podia fazê-lo em, praticamente, qualquer local. Tanto que algumas casas já então existentes estavam completamente fora do alinhamento seguido por outras, as quais, por sua vez, não se alinhavam com as do grupo mais adiante. Como havia pouca gente, ninguém notava que aquele já era um começo ruim. Ruim, não. Péssimo.

Paulista tem prefeito que se possa chamar de administrador público minimamente competente? Ou teve, nas últimas quatro décadas? Pelo jeito, não. Nem Paulista, nem Goiana, nem Itamaracá, nem Abreu e Lima, nem Igarassu, nem Itapissuma... para citar apenas os que têm praias em seu território.

Se essas pessoas tivessem que pagar pelos danos causados, nem a fortuna de Eike Batista iria dar para o gasto.

Gustavo Maia Gomes

ANEXO
LISTA DOS GOVERNADORES DE PERNAMBUCO E DE PREFEITOS DE PAULISTA, GOIANA E ITAMARACÁ (DESDE A DÉCADA DE 1980) 

A lista abaixo contém os nomes de todos os governadores de Pernambuco e prefeitos das três cidades, desde a década de 1980. Ela está aí como registro histórico. É claro que nem todos esses administradores públicos foram igualmente responsáveis pelo assassinato das praias do Litoral Norte. Alguns até tomaram iniciativas elogiáveis para combater o caos que se formou na região.

Prefeitos de Paulista
§  Ademir Barbosa da Cunha (1976/83)
§  Geraldo Pinho Alves (1983/89)
§  Ademir Barbosa da Cunha (1989/93)
§  José Castro de Resende (1993/97)
§  Geraldo Pinho Alves (1997/2000)
§  Antonio Ricardo Cabral de Souza (2000/00)
§  Antônio Wilson Speck (2001/04)
§  Yves Ribeiro de Albuquerque (2004, atual)

Prefeitos de Goiana
§  Osvaldo Rabelo Filho (1977/1983)
§  Harlan de Albuquerque Gadelha (1983/1988)
§  Osvaldo Rabelo Filho (1989/1990)
§  Antônio carlos Correia de Souza (1990/1992)
§  José Roberto Tavares Gadelha (1993-1996)
§  Osvaldo Rabelo Filho(1997-2000)
§  Edval Félix Soares (2001-2004)
§  José Roberto Tavares Gadelha (2005-2006)
§  Henrique Fenelon de Barros Filho (2006-2008)
§  Henrique Fenelon de Barros Filho (2009, atual)

Prefeitos de Itamaracá
§  Everaldo José Costa Galvão eleito em 1988
§  Paulo Fernando Pimentel Galvao eleito em 1992
§  Joel de Barros Monteiro Junior eleito em 1996
§  Paulo Volia eleito em 2004
§  Rubem Catunda da Silva Filho eleito em 2008

Governadores de Pernambuco
§  Marco Antônio de Oliveira Maciel (1979/1982)
§  José Muniz Ramos (1982/83)
§  Roberto Magalhães Melo (1983/86)
§  Gustavo Krause Gonçalves Sobrinho (1986/87)
§  Miguel Arraes de Alencar (1987/90)
§  Carlos Wilson Rocha de Queirós Campos (1990/91)
§  Joaquim Francisco de Freitas Cavalcanti (1991/95)
§  Miguel Arraes de Alencar (1995/99)
§  Jarbas de Andrade Vasconcelos (1999/2006)
§  José Mendonça Bezerra Filho (2006/07)
§  Eduardo Henrique Accioly Campos (2007, atual)

(A lista completa de prefeitos de Itamaracá não foi localizada)

Este artigo está sendo publicado, simultaneamente, em
(13/03/2012)




2 comentários:

  1. Prezado Dr.Gomes, estou aqui em casa, na Vila Velha,Itamaracá, aplaudindo literalmente as suas palavras ! Pensei que estive o unico que pensava assim ! Saiba Dr. que as ultimas partes no sul da ilha, que ainda não forem estragadas, estão hoje sob uma forte ameaça de correr a mesma sorte que a orla norte/sul. Existe um cabal de empresarios/politicos que carecem de qualquer carinho pela ilha, e no afã do maldito lucro estão para "desinvolver" uma das ultimas areas historico/ambiental que ainda fica no litoral pernambucano. Gostaria convidar-lhe a se juntar à luta para salvar esse ultimo recanto de sanidade. Christopher Sellars. (moro na Vila Velha. meu email :- christopher.sellars@gmail.com

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    1. A luta para salvar, não apenas "este último recanto de sanidade", mas também os outros, merece ser travada. No que eu puder colaborar, o farei com prazer.

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