quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Uma questão de graus


Ninguém mais, fora dos Estados Unidos, parece lembrar de Mark Twain, o escritor morto em 1910. De Will Durant (1885-1981), ainda menos. Esse escrevia pelos cotovelos. Com sua mulher, Ariel, produziu uma "História da Civilização" em muitos volumes, pela qual jamais me interessei. Mas, Will Durant foi autor de dois livros que me marcaram. Dou-lhes os títulos em traduções: "Os Grandes Pensadores" e "Filosofia da Vida".

Li-os quando ainda era um garoto, ou quase. O primeiro, emprestado da Biblioteca Pública de Casa Amarela (o bairro do Recife onde voltei a morar, trinta anos depois). Foi em "Os Grandes Pensadores" que primeiro soube de Oswald Spengler, Hermann Keyserling, Gustave Flaubert, Anatole France e, sobre todos, Bertrand Russell. "Filosofia da Vida", por seu turno, me apresentou a muito mais gente que amava os livros. Inclusive, Mark Twain.

Cito Will Durant, de memória: 

"Há vinte anos, Mark Twain filosofava. — O corpo e a alma são entidades independentes? — Sim. — Então, me diga: como a alma se comporta quando o corpo está bêbado?"

Lembrei-me desse diálogo ao enfrentar, num fim de semana qualquer, em cidade onde tais coisas acontecem, os termômetros marcando 38 graus e a televisão dizendo que a "sensação térmica" era ainda pior. Experimente caminhar pela rua num dia assim. A mais extraordinária atração turística perderá para um boteco refrigerado; as janelas do metrô parecerão mais belas do que o encontro das montanhas com o mar; nada será melhor que um copo d'água bem gelada.

Aprendi, enfim, como a alma se comporta quando o corpo está submetido a uma "sensação térmica" de 46 graus.

(Publicado no Facebook, 6/1/2017)

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