sábado, 15 de outubro de 2011

Suape ou o retorno de Jedi


Gustavo Maia Gomes
  
Segundo a Wikipédia, que não me deixa mentir (embora, com certa freqüência, ela própria o faça), o Retorno de Jedi, lançado em 1983, foi o sexto filme da série Guerra nas Estrelas. Arrecadou milhões de dólares pelo mundo, estando entre as cem maiores bilheterias da história. Um marco não Maciel.
– Mas o quê Suape tem a ver com o Jedi?
– Não é com o Jedi; é com o retorno: Suape tem a ver, e muito, com o inesperado renascimento do otimismo econômico “desenvolvimentista” dos anos 1950 e 1960 em Pernambuco; talvez, no Nordeste; um pouco menos, no Brasil.
No universo intelectual daquela época, produzido, especialmente, pelos economistas, reconhecia-se a pobreza de muitas nações, regiões ou estados – e essa era uma coisa nova. Mas se acreditava, sobretudo, que o desenvolvimento econômico traria a eliminação da pobreza– e essa era uma coisa novíssima.
Para todos os efeitos práticos, desenvolvimento queria dizer industrialização: isso é transparente no relatório do GTDN, escrito por Celso Furtado, em 1959. (A sigla tornou-se um nome que dispensava traduções; hoje, é bom lembrar que GTDN quer dizer Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste. Dali saiu a ideia da Sudene, Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste.) O relatório Furtado propunha quatro grandes linhas de ação para a região, mas não havia dúvida de que, das quatro, a industrialização era a mais importante. Em Pernambuco, o símbolo da esperança desenvolvimentista era o “Complexo Industrial Portuário de Suape”, que veio bem depois.
Assim como no Nordeste, no Brasil e no mundo. Desde antes do GTDN, o Brasil de Vargas (especialmente no seu último período de governo, 1951-54) e, sobretudo, o de Juscelino Kubitscheck (1956-61) acreditou na ideia de que a industrialização traria a riqueza de muitos e o fim da miséria de muitos mais. E, de uma forma geral, a tese parecia estar sendo demonstrada pelos fatos: com poucas exceções, os anos que vão do fim da Segunda Guerra (1945) até o segundo choque do petróleo (1979) testemunharam, no Brasil, vigoroso crescimento econômico propulsionado pela industrialização. Os indicadores sociais melhoraram muito; o emprego cresceu; a totalidade da população se beneficiou. Uns mais, outros menos, é verdade.
SURPRESAS
Mas a História reservava surpresas. A fase de grande crescimento da economia mundial iniciada em 1945 produziu desequilíbrios diversos como a inflação do dólar e a aguda dependência dos países desenvolvidos com relação ao petróleo do Oriente Médio. Uma combinação de fatores habilmente explorada, em 1973, pelos países exportadores que, em poucos meses, quadruplicaram o preço de venda do produto, precipitando a recessão mundial. (Da qual o Brasil conseguiu escapar, por mais seis anos, ao custo de uma enorme dívida externa.)
Quando o vigoroso crescimento mundial com inflação baixa (embora crescente) foi sucedido pela estagnação com forte subida de preços – uma estagnação que durou anos –, o mundo e o Brasil e o Nordeste e Pernambuco perderam a fé no desenvolvimento e na industrialização como remédios para a criação de riquezas e a superação da miséria. Nas duas décadas perdidas (1980-2000) que se seguiram ao segundo choque do petróleo, a economia brasileira alternou uns poucos anos de crescimento baixo com muitos anos de crescimento nenhum. O mesmo ocorreu no Nordeste e em Pernambuco.
Neste Estado, embora o ideal industrializante de Suape nunca tenha sido, oficialmente, esquecido, as esperanças de criação de riquezas e de superação da miséria se voltaram, cada vez mais, para setores econômicos como o turismo – ou os serviços, em geral – e a fruticultura irrigada. E, ainda mais marcantemente, para programas diretos de transferência de renda, como o Bolsa Família. Enquanto isso, a indústria pernambucana mal conseguia se manter viva.
E ENTÃO, DE REPENTE...
Não mais que de repente, tudo isso mudou. Os investimentos produtivos que, na percepção profissional e popular, estão trazendo novo fôlego e novas esperanças à economia pernambucana são todos industriais (e localizados em Suape): a refinaria de petróleo, o estaleiro naval, a fábrica de resinas, o pólo petroquímico, a montadora de automóveis, a siderúrgica. Ou seja, em perspectiva histórica, a agricultura irrigada tornou-se realidade e os serviços deram sua contribuição ao desenvolvimento de Pernambuco. Mas só a indústria – a velha heroína dos antigos enredos – foi capaz de sacudir o estado. Antes e agora.
É o retorno de Jedi.

(Publicado na revista Nordeste Econômico, Ano 4, n. 20, janeiro de 2011)

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