terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

MARIO SETTE E O CAIS DA LINGUETA

Gustavo Maia Gomes
Recife, 2-2-2019
Existe nome mais delicioso para um lugar do que “Cais da Lingueta”? Pois ele existiu, no Recife, até os primeiros anos do século XX. Ficava próximo ao atual Marco Zero, cartão postal muito conhecido da cidade. Com as obras do porto, o velho cais desapareceu. Mas, uma parte dele foi encontrada embaixo da terra, em 2011, quando se estava construindo o Museu do Sertão.
No seu livro Arruar: História pitoresca do Recife antigo (Rio de Janeiro, Editora CEB, 1948), Mario Sette conta casos relacionados ao Cais da Lingueta. Transcrevo o que achei mais interessante.
“A Lingueta tinha, sempre, uma novidade. Hábito velho, de quem fica à porta da cidade. Não fora dali que o popularíssimo Garrafuz, no século XVIII, embarcara de modo inédito para Lisboa? Era ele filho de um fogueteiro, e um boêmio integral. Certa vez, dá-lhe o pai uma moeda, um patacão, para trocar ali pelas redondezas. Sai Garrafuz de loja em loja, e nada. Já havia dificuldade de moeda miúda sem existirem ainda as passagens de bondes... De déu em déu, Garrafuz chega à Lingueta, de onde costumava admirar os navios e os marujos. Ali, um grupo desses convida-o:
-- Vamos a Portugal, Garrafuz?
E o rapaz responde.
-- Vou, sim.
E com a maior naturalidade do mundo desceu a rampa, tomou o bote e meteu-se na barca. Estava uns dois anos ausente sem dar novas de si. Até que um dia desembarca na Lingueta, toma o caminho de casa, entra na tenda do pai e como se tivesse saído meia hora antes, restitui-lhe o patacão dizendo:
-- Não achei troco, não.”
(Pág. 81)

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