terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

O HOMEM QUE CONSTRUÍA

Gustavo Maia Gomes
Recife, 12-2-2019
"A casa [que já existia] era péssima, mal dividida, estragada e suja", escreveu tia Heloisa de Araújo Pedrosa (1916-2007) em suas memórias, referindo-se ao Engenho Velho, em Santa Rita, PB, comprado em 1899 pelo avô dela, Manoel Sebastião de Araújo Pedrosa (1853-1906) e herdada pelo pai (1889-1936), de mesmo nome.
Ela prossegue: "o dono anterior [do engenho] não tinha nenhuma noção de higiene. A estrebaria era dentro de casa. Porém, era uma boa propriedade. A casa [ficava] no alto, com a vista linda para o engenho em baixo, com o Rio Paraíba passando atrás e serpenteando pelas várzeas".
Por ser tão ruim a casa existente no Engenho Velho, os pais de Olga Dias Cardoso (1895-1978) condicionaram o casamento dela com o segundo Manoel Sebastião à construção de outra. O noivo obedeceu, claro: em 1914, a nova casa estava pronta; pouco depois, em outubro, meus avôs maternos se casaram. A notícia, não sei bem por quê, saiu em O Paiz, jornal do Rio de Janeiro.
Foi esta casa (depois do Engenho Velho, no mesmo local, vieram as usinas Pedrosa, Santana, Agroval) que eu fotografei na semana passada. Minha mãe, Maria Stella de Araújo Pedrosa (1917-2001), a visitou em 1987. Ela não seria a única a ser construída por seu pai, Manoel Sebastião. Em 1925, situação parecida à de 1914 aconteceu: ele e a família se mudaram para Atalaia, AL, onde ficava a Usina Uruba, que meu avô havia adquirido.
Novamente, a casa já existente era péssima. De modo que Manoel decidiu construir outra. Desta vez, ainda segundo as memórias de Heloísa, o estilo seria inteiramente moderno, europeu. É que Olga colecionava plantas de casa reproduzidas em jornais. Num deles ela encontrou a morada que queria ter em Atalaia. E teve.
Essa segunda casa feita pelo "homem que construía", concluída em 1936, ainda está lá. Visitei-a em muitas ocasiões, a última delas há uns três anos. (Lourdes Barbosa, Demetrio Neto e Marcus Antonio Pedrosa Ferreira estavam comigo.) É bonita e imponente. Mas foi marcada por uma tragédia. Na semana em que a mudança se faria, meu avô pegou uma infecção grave. Em poucos dias, morreu.
A mudança dos sobreviventes foi feita em clima fúnebre. Stella morou lá até se casar, seis anos mais tarde. Tinha todas as razões do mundo para não gostar muito daquela casa marcada por uma grande frustração. Manoel Sebastião a construiu com esmero. Mas nunca dormiu uma noite ali.

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