quinta-feira, 26 de outubro de 2017

ESCÓCIA, CATALUNHA E O NORDESTE BRASILEIRO



A Escócia quer ser independente; a Catalunha quer ser independente; alguns jornalistas mal informados e economistas que erraram as contas voltam a brincar com a ideia de que o Nordeste brasileiro se torne independente.
Nada tenho a dizer sobre a Escócia ou a Catalunha. Mas, um Nordeste transformado em país sob a justificativa de que nossa pobreza (sim, sou nordestino — e moro no Recife) se explicaria pela suposta "exploração" por parte do Sudeste, esse Nordeste seria um sério candidato a Haiti.
Ao contrário de ser explorado, o Nordeste vem recebendo há décadas transferências líquidas de renda (e/ou de capitais) do restante do país. (Ou do mundo, mas essas entradas internacionais têm magnitude desprezível.)
O indicador mais claro de que somos recebedores líquidos de transferências é que temos tido um persistente saldo negativo na balança comercial, tanto com as demais regiões quanto com o resto do mundo. (O comércio interregional é mal coberto pelas estatísticas brasileiras, mas as poucas que existem me permitem afirmar isso.)
Até dez ou vinte anos, tínhamos saldo comercial positivo com o resto do mundo (porém negativo — e maior, em valor absoluto — com as demais regiões). Desde então, somos deficitários nos dois comércios. O financiamento desse duplo déficit, por definição, só pode se dar pela entrada líquida de recursos vindos de outras regiões ou de outros países.
Reconhecer isso não equivale a reservar ao Nordeste o papel de bandido, enquanto as demais regiões seriam os "mocinhos" do filme. Significa dizer que não podemos explicar nossa pobreza nesses termos simplórios de "quem rouba quem". O Haiti pensou que podia e se lascou.
O Nordeste tem um crédito enorme com as demais regiões (especialmente, o Norte da borracha e o Sudeste da indústria) como fornecedor de mão de obra não-especializada. De certa forma, o Brasil tem um débito enorme com os nordestinos (para ser sincero, não apenas com os nordestinos!) por nunca lhes ter oferecido uma educação obrigatória, universal e de qualidade, que os credenciasse a ser produtivos e ricos, fazendo com que a região também se tornasse rica e produtiva.

Por esse caminho — o de romper as condições estruturais que, realmente, explicam nossas dificuldades — podemos iniciar uma discussão potencialmente frutífera sobre a riqueza e a pobreza das regiões. A velha conversa de "coitadinho pra cá, coitadinho pra lá", só nos levará, mesmo, a continuar dependendo do dinheiro alheio.

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