quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

AS PALAVRAS


Gustavo Maia Gomes

Como alguns sabem, estou escrevendo um segundo livro sobre a história do Nordeste açucareiro contada pelas biografias de parentes meus. O primeiro (“O Trem para Branquinha”, Recife, Cepe, 2018) foca nos anos 1800 e na metade inicial do século XX. Este (“Uma Noite em Anhumas”, com previsão de publicação em 2020) cobre os anos 1875-2012. Há sobreposição de períodos, sim, mas isso é justificado em outro lugar.

Para compreender melhor as histórias dos personagens, interessa-me acompanhar as transformações econômicas, sociais e políticas da civilização açucareira e sua eventual superação pelas cidades. Isso tem sido feito (inclusive, por mim) de inúmeras formas. A que apresento agora é complementar, tem pretensões limitadas, mas não deixa de lançar luz sobre a realidade que quero conhecer.

Selecionei 13 palavras (Açúcar, Comunismo, Comunista, Coronel, Eleição, Eleições, República, Republicano, Revolta, Revolução, Senhor de Engenho, Usineiro) e perguntei ao “Diario de Pernambuco” (via Biblioteca Nacional) quantas vezes elas haviam sido escritas em suas sucessivas edições. Examinei todas as décadas, desde 1850-59 até 1980-89, agrupei os resultados por palavras e dividi o número de ocorrências de cada uma pelo número total de páginas do jornal na respectiva década.

Com a marca de 52,63, “Açúcar” (que, então, se escrevia “assucar”) foi a palavra que mais vezes apareceu em 1850-59. A alta frequência é um indicador da importância do produto. “Coronel” (36,83) foi a segunda palavra mais empregada, muito acima de “Eleição + Eleições” (18,25) e de outras menos escritas. Em meados do século XIX, ninguém tinha ouvido falar em comunistas e comunismo.

Em 1900-09, as palavras “República” e “Republicano” (somando 68,0) dominaram o noticiário, refletindo não apenas a então recente proclamação da República, mas também os problemas de consolidação que o novo regime enfrentou, na última década do século XIX e na primeira do XX. Os coronéis, pelo visto, não foram abalados por Deodoro, Floriano e seus sucessores, pois continuavam a ser muito mencionados na imprensa recifense. O açúcar tinha caído para a terceira posição. Ainda não havia menção a comunistas e comunismo.

Na última década para a qual é possível (por enquanto) fazer o tipo de pesquisa a que me refiro, ou seja, 1980-89, as palavras “Eleição + Eleições” (25,78) assumiram grande destaque. Foi quando se deu o fim do regime militar e a subsequente redemocratização do país. Os coronéis ainda tinham presença significativa (provavelmente, os de 1989 já não eram do mesmo tipo que os de 1850, mas essa é outra história) e o açúcar mantinha sua terceira posição.

Há muito mais a ser dito, mas não agora e, talvez, nem aqui.

(Publicado no Facebook, 9/10/2019)

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