quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

JULIÃO, A BIOGRAFIA


Gustavo Maia Gomes

Perguntei a jovens instruídos: "Já ouviu falar em Francisco Julião?" Responderam-me: "Não". Lamentável. Pois, nos anos 1955-64, o pernambucano Francisco Julião Arruda de Paula (1915-99) foi uma das personalidades políticas mais importantes do país. Teve os direitos políticos cassados logo após a derrubada de João Goulart. Fugiu da perseguição policial, mas foi capturado e preso em junho de 1964.

Julião formou-se (em 1939) pela Faculdade de Direito do Recife, na mesma turma de meu pai. (Que o visitou na prisão, num gesto de coragem, embora os dois jamais tivessem tido maiores ligações.) Advogava de graça em favor dos camponeses. Isso lhe deu visibilidade para se tornar, um pouco adiante, primeiro, deputado estadual, em seguida, federal.

Pela sua liderança no campo, os serviços de informação norte-americanos o consideravam um potencial Fidel Castro brasileiro. De fato, os dois tinham muitas afinidades ideológicas. Tanto que, escrevendo da prisão para sua filha recém-nascida, Julião disse: "só de uma coisa não me despojaria, Isabela, para te ter nos braços: de minha dignidade de revolucionário".

Professar a crença na "Revolução" (à moda de Marx, Engels, Lênin, Mao, Stálin ...) como um substituto terrestre do desacreditado paraíso celestial era menos absurdo então do que viria a ser depois, quando se tornou inegável que os governos comunistas ou socialistas não passavam de ditaduras sanguinárias produzindo gigantescos fracassos econômicos.

Não é estranho, portanto, que Julião tenha seguido aquela moda. (Eu próprio fui, também, parcialmente atingido por ela, na mesma época.) Penso, entretanto, que o seu legado mais importante à posteridade não foi a fé na Revolução, mas a integridade moral que sempre demonstrou ter. Mesmo quando estava flagrantemente errado em suas posições políticas.

Cláudio Aguiar ("Francisco Julião: a Biografia", Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2014) escreveu um livro valioso, ganhador de prêmios. Só agora o li. Recomendo que façam o mesmo os interessados na história política recente do Brasil.

(Publicado no Facebook, 24/1/2020)

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