quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

DORMINDO COM A HISTÓRIA


Gustavo Maia Gomes

O Palace foi o primeiro hotel de luxo em Salvador. Hospedava os coronéis do cacau e era muito procurado pelos políticos. “Reinou absoluto de 1934 até 1952, [quando foi] ultrapassado pelos confortos mais modernos do Hotel da Bahia”. (João Zuccaratto.)

Não apenas pelos “apartamentos amplos, banheiros exclusivos, elevadores de última geração, ramais telefônicos em todas as unidades e outros serviços” do concorrente. Também pela decadência do antigo centro comercial de Salvador.

Em 2003, o hotel fechou. Dez anos depois, Antônio Mazzafera decidiu ressuscitá-lo, com a velha imponência e uma nova marca: Fera Palace Salvador Hotel. (Achei o nome horroroso. Conhecendo a história, entretanto, ele se torna palatável: o “Fera”, no caso, não remete a tigres, leões, ursos ou leopardos, mas ao nome do empresário.)

Maravilha. “Os empreendedores patrocinaram um retrofit na edificação, preservando características externas, detalhes internos e essência original, às quais foram agregados confortos necessários da modernidade”. (“Retrofit” é de lascar, mas não fui eu quem escreveu isso.)

O projeto de reforma, do arquiteto Adam Kurdahl, procurou “recuperar tudo de original possível”. Diz Zuccaratto, citando Kurdahl: “restauramos cada detalhe das suas 629 janelas, 3.500 metros quadrados da fachada, adornos Art Déco e piso de taco e de mármore, combinação de arte, beleza, funcionalidade e originalidade”.

Foram preservados ao máximo os elementos originais do empreendimento. “Mas se, na configuração antiga, havia toaletes de uso comum, feminino e masculino, por andar, agora cada quarto tem o seu, exclusivo”. E carregador USB para celulares, caixa de som, cofre de fechadura digital, despertador, minibar, secador de cabelo e TV.

Estivemos lá, Lourdes e eu. Barato, não é, nem poderia. Notamos pequenas deficiências nos serviços. A comida do Restaurante Lina (onde jantamos com os amigos Waldeck Ornelas e Luiz Carreira) não nos impressionou . Nada disso, entretanto, comprometeu terrivelmente.

O Fera retribuiu com sobras o que lhe pagamos. Sem ele, não teríamos sonhado com as histórias do cacau, nem sabido o que Jorge Amado diz do velho Palace Hotel em “Dona Flor e seus Dois Maridos”.
  

Fonte das citações: João Zuccaratto, “Cidade de Salvador recupera antigo ícone da hotelaria de luxo com Fera Palace Hotel”, em https://www.turismoria.com.br/…/cidade-de-salvador-recuper…/ postado em 18/10/2016.

(Publicado no Facebook, 21/9/2019)

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